ENTREVISTA O baixista e compositor novaiorquino William Parker virá com
seu quarteto ao país para dois concertos no mês de agosto, dentro do festival
Jazz na Fábrica, que acontece no Sesc Pompeia (SP). Antes de desembarcar por
aqui, Parker conversou com o FreeForm, FreeJazz sobre sua música e os múltiplos
projetos que conduz.
Por Fabricio Vieira
FF: Esta é a primeira vez que vem ao Brasil com um projeto
seu. Gostaria que falasse um pouco sobre o William Parker Quartet e os
concertos que fará no país.
Parker: “O William Parker Quartet existe desde maio de 2000,
são 15 anos anos de existência com a mesma formação. Rob Brown no sax alto,
Lewis Barnes no trompete, Hamid Drake na bateria e eu no baixo. Nós tocamos
cerca de 200 composições originais com o grupo. Para nossos concertos no
Brasil, apresentaremos algumas peças do nosso songbook e também novos temas.
Temos uma nova composição dedicada ao Horace Silver e também um novo tema bebop
chamado ‘Tecumsech’, dedicado ao chefe indígena Shawnee.”
FF: Como chegou à essa música e escolheu o baixo como
principal instrumento? O sr. toca e coleciona instrumentos menos usuais também...
(Instrumentos na casa de Parker) |
Parker: “Quando eu tinha sete anos meu pai chegava em casa
depois do trabalho e imediatamente colocava para tocar o disco ‘Ellington Live
at Newport 56’, eu e meu irmão Tommy ficávamos lá ouvindo Diminuendo and
Crescendo in Blue, que tem um longo solo
do tenorista Paul Gonsalves. Essa era nossa rotina noturna; passados um ou dois
anos, meu pai chegou em casa com instrumentos musicais para nós, um trompete
para mim e um saxofone para meu irmão. Depois, passaríamos a ter aulas e acabei
mudando para o trombone, depois para o violoncelo e, eventualmente, trocava
pelo baixo. O sonho do meu pai era que um dia eu viesse a tocar na orquestra do
Ellington. Depois eu compreendi que poderia mesmo contribuir com a música
através do baixo. Daí estudei com Richard Davis, Art Davis, Milt Hinton, Jimmy
Garrison e Wilbur Ware.
“Eu passei a me interessar por instrumentos de todo o mundo
numa época em que me reunia com Donald Garrett e Don Cherry. Também por minha busca por sons que
estivessem mais perto da terra e mais distante do piano. Eu adquiri minha primeira
flauta shakuhachi em 78 e comprei um Kora [instrumento de cordas africano] mais ou menos nessa época também.”
FF: O sr. já tocou com uma extensa lista de músicos
excepcionais. Mas gostaria de destacar duas longas associações em particular:
como se deu seu encontro com Cecil Taylor? E a parceria com David S. Ware?
Parker: “A primeira vez que toquei com Cecil Taylor foi em
1974 no Carnegie Hall, eu fui apresentado ao Cecil pelo trompetista Arthur
Williams. O David S. Ware tocou no mesmo concerto e eu reencontrei David um ano
depois. Eu entrei para o Cecil Taylor Unit em dezembro de 1980 e toquei com ele
até 1991. Eu me juntei ao grupo do David S. Ware em 1988 e tocamos juntos até
sua morte, em 2012.”
FF: O sr. tem trabalhado como líder cada vez mais. De que maneira
sua forma de lidar com a música se altera nesse contexto?
Parker: “Eu tenho o quarteto, um sexteto chamado Raining on the Moon, a The Little Huey Creative Music Orchestra, dentre outros projetos,
como o Martin Luther King series, música para dança, o Ellington Project, o The
Curtis Mayfield Project etc. Em todos esses projetos é minha responsabilidade organizar
a música, sempre que necessário, para ajudar a trazer essa música para a vida,
melodias, ritmos, ou muitas vezes simplesmente deixando os músicos tocarem da melhor
forma que sabem fazer. A música gira pela minha cabeça durante todo o dia e
toda a noite, e eu a escrevo pensando nos instrumentistas ou apenas seleciono o
som que vai fazer as coisas flutuarem...”
FF: Como a estrutura do William Parker Quartet se encaixa em
seus conceitos musicais?
Parker: “A ideia do quarteto é incluir todas as
possibilidades em música. Ter melodias e ritmos dançando ao redor, com os
músicos tendo liberdade para irem até onde e como acharem que devem,
acelerando, tocando lentamente, acelerado contra lento, latin jazz, elementos de world
music, bebop, space music, blues e gospel.”
FF: Sua música é muito orientada ao diálogo com o público.
Gostaria de saber o quanto as coisas são diferentes quando está em estúdio.
Parker: “Uma gravação em estúdio é como estar olhando um pôr
do sol. Uma apresentação ao vivo é como estar dentro do pôr do sol.”
FF: O sr. está muito ligado também ao Vision Festival. Como surgiu a proposta desse evento?
Parker: “O Vision Festival foi fundado em 1996 pela
coreógrafa e dançarina Patricia Nicholson, ela tem sido a responsável pela organização
durante esses quase vinte anos, eu estou no conselho curador do festival e sei
que, com certeza, recebo crédito demais pelo evento. Ele existe devido aos
esforços da Patricia; o festival abrange improvised music, poesia criativa,
dança e artes visuais. É um evento anual, que se estende por seis dias em junho ou
julho.”
FF: O que seria a Creative Improvised Music, que é como
chama a música que faz?
Parker: “Creative Improvised Music é qualquer música que se
desenvolve, quando tocada, para gestar algo maior que ela mesma. O que a música
é depende sempre do sistema improvisacional utilizado pelo músico.”
FF: Uma de suas mais recentes gravações é o belíssimo 'To
Roy', concebido com o saxofonista Oliver Lake. O que pode contar sobre esse
trabalho? E o que vem por aí?
Parker: “Eu já toquei com o Oliver Lake em diferentes formações
nesses anos todos. O pessoal da Intakt viu a gente tocando e perguntou se não
queríamos fazer algo em duo. Oliver trouxe algumas peças suas e eu levei
outras, e foi ótimo. Eu tenho agora um box com 3 Cds [“For Those Who Are Still”,
pela AUM Fidelity] para ser lançado em agosto. Essa gravação apresenta minha
primeira peça para orquestra sinfônica.”
(William Parker, Patricia Nicholson, Hamid Drake. @The Stone,
2013)
“WILLIAM PARKER Quartet”
Quando: 15/8 (sab), às 21h; e 16/8 (dom), às 19h
Onde: Teatro do Sesc Pompeia (SP)
Quanto: R$ 15 a R$ 50 (inteira)
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*quem assina:
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Atualmente escreve sobre livros e jazz para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), e “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records)
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Atualmente escreve sobre livros e jazz para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), e “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records)