LANÇAMENTOs Disco
de estreia do fantástico quarteto comandado por Peter Brötzmann é reeditado,
pela primeira vez em vinil...
Por Fabricio Vieira
Em 19 de agosto de
1993, subia ao palco do Towhall Charlottenburg, em Berlim, durante o evento
Free Concerts, um novo quarteto internacional. Formado por veteranos do free
jazz, o grupo trazia nada menos que o alemão Peter Brötzmann (1941-2023), o
japonês Toshinori Kondo (1948-2020) e os americanos William Parker e Hamid
Drake. Por ali, envolvendo a banda, pairava o Holy Ghost: Albert Ayler (1936-1970). Afora
a menção no título do disco de estreia do grupo, vindo daquele show – Die Like
a Dog: Fragments of Music, Life and Death of Albert Ayler –, o lendário
saxofonista ecoa também na música então apresentada. Trechos (fragmentos,
talvez seja melhor dizer) de composições de Ayler – Prophet, Ghosts, Spirits,
Bells... – surgem aqui e ali nas peças tocadas naquele noite.
O Die Like a Dog
foi um dos grandes grupos do free jazz da década de 1990. A princípio, era mais
um quarteto comandado por Brötzmann; depois assumiu o perfil de “grupo” mesmo,
sendo identificado pelo nome Die Like a Dog Quartet. “The idea of expressing my
love of and admiration for Albert Ayler – both man and music – in a musical
statement is not new. We both tried to do similar or almost identical things at
the same point in time, each independently and without knowing anything about
each other – each of us within his own culture”, diz Brötzmann no encarte
original do disco de estreia. A altamente potente música da banda, que também
não se furtava de momentos mais divagantes, tinha um tempero especial com
Toshinori Kondo, que tocava trompete eletrificado e eletrônicos. O Die Like a
Dog é, na trajetória de Brötzmann, um projeto tão relevante e marcante quanto
foi o Last Exit nos anos 80 e o Full Blast nos anos 2000.
O grupo esteve
ativo durante a década de 1990 – existe um bootleg de abril de 2000, gravado no
Tonic (NYC), mas já sem Kondo –, tendo deixado um punhado de álbuns, todos
captados ao vivo. Curiosamente, quase todos foram gravados em Berlim, em
diferentes edições do festival Total Music Meeting: “Close Up”, gravado em
novembro de 1994; “Little Birds Have Fast Hearts – No. 1 & 2”, captado em
novembro de 1997; e “Aoyama Crows”, o último testemunho oficial deles, vindo de
1999. O roteiro só mudou no show registrado em “From Valley To Valley” (1998),
que vem de um concerto em Massachusetts, EUA, e no qual Kondo foi substituído
pelo trompetista Roy Campbell (1952-2014); este também é o único título editado
pelo Eremite Records, sendo que os outros títulos saíram pela gravadora FMP. Os álbuns
do Die Like a Dog esgotaram há muito. Em 2007, o selo Jazzwerkstatt lançou um
box com os 4 discos da banda originalmente publicados pelo FMP. Por algum
motivo contratual provavelmente, os álbuns do grupo não estão disponíveis nas
plataformas digitais, o que sempre é ruim e inexplicável nos dias atuais (para aqueles
que não possuem uma cópia dos álbuns, para ouvir esta fundamental música tem
que recorrer ao Youtube). Por isso é ainda mais empolgante a notícia de que a Trost
Records/Cien Fuegos vai colocar no mercado, pela primeira vez em vinil, o título
de estreia do quarteto em versão LP duplo, 180 gr.! Em pré-venda, Die Like a
Dog: Fragments of Music, Life and Death of Albert Ayler será lançado no dia 19 de julho.
(Die Like a Dog Quartet - live in Berlin, november 1995)
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*quem assina:
Fabricio
Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária.
Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda
correspondente do jornal em Buenos Aires. Colaborou também com publicações como
Entre Livros e Jazz.pt, de Lisboa. Nos últimos anos, tem escrito sobre música e
literatura para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns
“Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), “The Hour of the Star”,
de Ivo Perelman (Leo Records), e “Live in Nuremberg”, de Perelman e
Matthew Shipp (SMP Records)