CRÍTICAs O projeto de Ivo Perelman Reed Rapture In Brooklyn, que rendeu uma série de 12 discos, agora ressurge com sua versão documentário...
Por Fabricio Vieira
(photo: Peter Gannushkin) |
Reed Rapture In Brooklyn, o filme, tem pouco mais de 2 horas de duração e vemos passar pela tela todos os músicos que participaram do projeto. A eles se juntam Chad Fowler, o dono do Mahakala Music, que co-produziu o filme, e o veterano crítico Gary Giddins, que cumpre o papel de trazer certo panorama histórico, falando também sobre personagens do jazz que não estão ali nas sessões retratadas, como que contextualizando a música que vemos ser criada (quem viu o documentário Fire Music lembrará que Giddins, curiosamente, desempenhou o mesmo papel lá). O principal cenário é o Park West Studios, no Brooklyn nova-iorquino, onipresente na história de Perelman – praticamente sua segunda casa, onde tem gravado praticamente tudo que editou na última década e meia. Foi lá que 11 das 12 sessões de duetos foram realizadas; apenas o encontro com Roscoe Mitchell teve outro endereço, tendo Perelman se deslocado até o lendário músico em Madison, Wisconsin. O esquema do filme é simples e direto, mas muito bem-conduzido, com uma dinâmica que evita se tornar repetitivo. Sequencialmente, vão surgindo na tela um músico de cada vez, dando seus depoimentos e depois em cenas durante a gravação do disco. Eles não falam necessariamente sobre a sessão de gravação em si que estão fazendo, explanam também sobre a sua música, memórias, momentos, o que ajuda a arejar o documentário, abrindo um pouco seu foco e evitando que se torne apenas um registro visual da gravação de um disco-projeto. E por mais que tenhamos visto em diferentes contextos declarações de Mitchell, McPhee, Murray, Vandermark, Berne e outros dos presentes que têm sido pilares do free jazz nas últimas décadas, vê-los falando sobre essa música que nos move é sempre algo estimulante. Para arrematar, é fundamental ver Perelman falando dos seus parceiros, dando uma ideia mais clara dos motivos que o levaram a escolher cada um dos 12 saxofonistas que dividiram o projeto com ele.
A chegada deste filme deve realimentar o interesse pelo
álbum que retrata (e, quem sabe, finalmente a Mahakala não se convence a soltar
os CDs? Lembrando que Reed Rapture In Brooklyn foi editado em outubro de 2022
apenas em formato digital. Um projeto como esse necessita ter uma versão física
para estar de fato completo, um box com livreto bem escrito caberia bem na
estante de muito entusiasta do free...). Sem dúvida o projeto ganha agora um
novo apelo, já que temos a sensação de maior intimidade com Reed Rapture In
Brooklyn, movidos pelas imagens das sessões que agora temos disponíveis. Uma questão
é que documentários musicais muito dificilmente entram no circuito de cinemas,
ficando mais restritos a exibições pontuais em festivais, o que limita muito o
alcance de sua distribuição. Lançar um DVD parece algo meio fora de discussão,
sendo hoje de comercialização ainda mais limitada que os CDs. Então, quem sabe,
uma parceria futura com uma plataforma de filmes – como o Fire Music fez com o Criterion – seja o melhor caminho a se almejar hoje em dia. Em última instância, o
que se espera é que Reed Rapture In Brooklyn, o filme, consiga circular; ficar
restrito a sessões em festivais aqui e ali é muito pouco e limitado para um
projeto de amplo interesse como este.
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*quem assina:
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Colaborou também com publicações como Entre Livros e Jazz.pt, de Lisboa. Nos últimos anos, tem escrito sobre música e literatura para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records), e “Live in Nuremberg”, de Perelman e Matthew Shipp (SMP Records)