FORCE: reedição de um clássico de Shepp & Roach



LANÇAMENTOs
E vai ter finalmente uma reedição à altura do clássico maior do free jazz Force, duo de sax e bateria de 1976 conduzido pelos mestres Archie Shepp & Max Roach...


 

Por Fabricio Vieira

 

Finalmente um dos maiores clássicos do free jazz vai ganhar uma reedição à altura: Force, explosivo e incontornável encontro entre Archie Shepp e Max Roach. Editada oficialmente em 1976, essa sessão lendária, que documenta um dos mais incríveis duos de sax tenor e bateria, apareceu à época pelo pequeno selo francês Uniteledis. Tão particular é tudo isso que vale contar que o Uniteledis foi um selo criado pelo Partido Socialista francês na década de 1970 para difundir o movimento e ideias revolucionárias (parte dos discos editados nem traziam música, mas sim discursos políticos). Isso cria ainda um contraste bem gritante com a reedição que sairá agora, quase cinco décadas depois: ela faz parte do Record Store Day, ou seja, será uma edição limitada e luxuosa, com preços algo salgados, como costuma ser com os lançamentos deste incensado evento anual. A reedição está a cargo de outro selo independente francês, o LMLR.

Esta é a primeira vez que Force reaparecerá em sua roupagem original, como foi concebido, com sua provocativamente impactante capa. Force ganhou uma edição japonesa ainda em 1977, pelo selo Victor; depois, só no começo da década de 1990, reapareceu em CD e LP (não autorizados, ao que parece) na Alemanha e na Itália. Mas sempre com outras capas. Nas versões dos anos 90, apareceram com genéricas imagens de arquivo dos dois músicos na capa, uma grande injustiça que descaracterizava profundamente o álbum (além disso, essas versões subtraíram até o nome do disco da capa!), gesto que, se não for explicado por algum problema de direito autoral que desconhecemos, ilustra bem o espírito censório sempre à espreita. Force é um álbum fruto da década de 1970 e dialogava profundamente com seu tempo. Nada na capa do disco é gratuito: em primeiro plano, o punho cerrado em riste, marca do Black Panther Party; logo atrás, Mao Tsé-Tung, o grande timoneiro, morto à época da gravação, boiando nas águas. Daí vamos à música e seus títulos. Vinil duplo, Force é dividido em duas peças: “Sweet Mao”, formado por três partes, “La Préparation”, “La Marche” e “Le Commencement”, que ocupam, cada uma, uma das faces do LP; e “Suid Afrika 76”, com título que faz referência ao massacre de estudantes/manifestantes em Soweto, na África do Sul, que forma a quarta face do segundo disco. São, então, 4 extensas faixas, com claras mensagens, uma em cada face do vinil, do mais inventivo e direto free jazz conduzido por dois mestres consumados do saxofone e da bateria. Max Roach e Archie Shepp tocaram juntos em duo em outras oportunidades após a experiência de Force. A apresentação que fizeram em agosto de 1979 no Jazz Festival Willisau, na Suíça, virou também disco, editado pelo selo Hat Hut como The Long March. Mas aqui apresentavam algo mais aberto; entre a retomada de uma peça de Force – “La Marche”, aqui chamada de “The Long March” – havia temas trazidos de outros contextos, inclusive os standards Sophisticated Lady e Giant Steps. Esta aguardada reedição de Force sairá no logo mais no Record Store Day, neste sábado, dia 22 de abril, em edição limitada de 1.200 cópias: “This double LP set, has deluxe packaging that will include an OBI strip, gatefold album jacket with two pockets, printed inner sleeves, original record labels and specialty color vinyl. 1st Clear Amber & 2nd Clear Brown Color Vinyl”.



 











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*quem assina:

Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Colaborou também com publicações como Entre Livros e Jazz.pt, de Lisboa. Nos últimos anos, tem escrito sobre música e literatura para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records), e “Live in Nuremberg”, de Perelman e Matthew Shipp (SMP Records)