MOVE: novo incendiário trio faz sua estreia


LANÇAMENTOs
Um novo trio formado em Portugal por Yedo Gibson, Felipe Zenícola e João Valinho lança seu impactante álbum de estreia... 

 



Por Fabricio Vieira

(foto: Nuno Martins)
Não são poucos os músicos brasileiros que, interessados no universo free jazzístico e da improvisação livre, acabaram por buscar no exterior um lugar para realizar sua arte. O contrabaixista e violoncelista Marcio Mattos foi pioneiro nesse processo, se estabelecendo em Londres ainda no início da década de 1970 e fazendo toda sua carreira por lá. Nos anos 80, seria a vez de Ivo Perelman ir para os Estados Unidos fazer sua história. Muito mais gente seguiu essa trilha no século XXI. Um que partiu em meados dos anos 2000 e ficou de vez foi o saxofonista paulistano Yedo Gibson. Um dos fundadores do seminal Abaetetuba, Gibson rumou para a Europa em 2005 e, após uma longa temporada na Holanda, migrou para Portugal, onde está estabelecido. Portugal também foi mais recentemente o destino buscado pelo baixista carioca Felipe Zenícola. Conhecido inicialmente pelo trio instrumental Chinese Cookie Poets, Zenícola foi aprofundando conexões com artistas da free music – a destacar shows e gravações com Paal Nilssen-Love – e, nos últimos anos, acabou adentrando a ativa cena de Lisboa. E foi por lá que surgiu este novo explosivo e imperdível projeto, que une Yedo Gibson, Felipe Zenícola e o baterista português João Valinho. Batizado de Move, o trio estreia em grande estilo com The City, álbum editado nesta semana pelo referencial selo português Clean Feed. Move é um petardo sem concessões. Com uma formação – saxes, baixo elétrico e bateria – similar ao seminal Full Blast, também remete ao universo sonoro do trio europeu pela intensidade e urgência. The City traz um concerto realizado pelo trio no Desterro Club, em Lisboa, no dia 6 de junho de 2022, e apresenta cinco peças diretas e cortantes, sem divagações, com uma energia coesa e concentrada que se espraia por cerca de 30 minutos.

Move canaliza nossos anseios estéticos e composicionais atuais e traz no nome a síntese do que esperamos dessa música: transformação e movimento constantes”, escreveu Zenícola em suas redes, se referindo ao projeto como uma banda de punkjazz e música improvisada. Gibson, Zenícola e Valinho são artistas muito experimentados e navegam por essas vias com segurança e firmeza, o que se reflete em uma música que, se crua e direta, também se revela de ampla inventividade, trazendo ar fresco ao lado mais incendiário da free music. “Boardwalk Bugs” não poderia abrir o registro de forma melhor: após uma breve introdução (se assim podemos chamar) de 24 segundos, já com sax e baixo puxando a voltagem sem demora, a música explode de vez com a entrada da bateria, em um aviso de para onde o ouvinte será levado (acaso improvisativo ou abertura ensaiada, o resultado é certeiro). Sempre mantendo a energia lá em cima, as faixas vão se sucedendo sempre trazendo algo diversamente atrativo, como os elementos rock mais presentes na pulsante “Patriot and the Truck”, que agarra os ouvintes de cara com seu riff de baixo arrebatador. The City é uma estreia daquelas pela qual a banda deverá ser sempre lembrada e não poderia ter sido melhor o fato de o disco ter sido lançado pela Clean Feed (e em CD!), o que vai ajudar em muito na sua repercussão e divulgação internacional. Fica a expectativa de que esse não tenha sido apenas um encontro passageiro entre os três músicos; o trio Move tem tudo para atrair ouvidos atentos e marcar presença em palcos mundo afora.

 


The City  *****

MOVE (Yedo Gibson/ Felipe Zenícola/ João Valinho)

Clean Feed

 



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*quem assina:

Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Colaborou também com publicações como Entre Livros e Jazz.pt, de Lisboa. Nos últimos anos, tem escrito sobre música e literatura para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records), e “Live in Nuremberg”, de Perelman e Matthew Shipp (SMP Records)