Resgatando o pioneiro Bengt ‘Frippe’ Nordström


LANÇAMENTOs
Obra pioneira do lendário saxofonista sueco Bengt ‘Frippe’ Nordström ganha finalmente reedição especial...




Por Fabricio Vieira

O saxofonista Bengt ‘Frippe’ Nordström (1936-2000) é o pai do free jazz na Suécia. Personagem obscuro do underground, que até hoje é pouco lembrado fora de seu país, Nordström esteve envolvido com o free jazz desde o seu começo e não só como músico: em outubro de 1962, ele foi o responsável pela gravação do que se tornaria o primeiro disco de Albert Ayler, então um músico em começo de carreira que estava passando uma temporada em Estocolmo. Este registro seria lançado de forma independente pelo selo que Nordström criou, o lendário Bird Notes, sob o título “Something Different!!!!”. O Bird Notes era realmente artesanal: Nordström manteve o selo em atividade por anos, fazendo edições que muitas vezes não passavam de dez cópias, por meio das quais conseguiu deixar registrada a pioneira música que fez na década de 1960. Se não fosse o Bird Notes, seria apenas uma lenda o fato dele ter sido um pioneiro na exploração do saxofone solista, antes mesmo de Anthony Braxton e Roscoe Mitchell adentrarem essas vias. Mas ele gravou suas improvisações solistas. E fez suas edições caseiras, em versões de 78, 45 e 33 rpm, em pouquíssimas cópias que distribuía aos amigos. São discos praticamente impossíveis de encontrar, coisa de colecionador que chega a ser comercializado por mais de US$ 1 mil. Neste esquema artesanal, Nordström editou também um álbum cheio, Natural Music, em 1968. O disco traz duas longas improvisações; no lado A, um duo de sax alto e contrabaixo; no B, a peça “Spontaneous Creation”, para sax tenor solo (no Discogs, tem uma cópia à venda por 650 euros...).

Este raro material está sendo resgatado agora (sim, somente agora, mais de duas décadas após a sua morte!). Trata-se de um box com 4 LPs trazendo as gravações solistas (e algo mais) realizadas por Bengt Nordström na década de 1960. Esse trabalho de resgate muito deve à dedicação de Mats Gustafsson que, além de colecionador, é grande admirador de Nordström (uma de suas influências confessas). Bengt "Frippe" Nordstr​ö​m - Vinyl Box está sendo editado pelo selo Ni-Vu-Ni-Connu, de Luxemburgo, em um cuidadoso box com, além dos LPs, extenso material textual e iconográfico. Estão aqui reunidas verdadeiras raridades da free music escandinava. Afora o citado álbum Natural Music (que é relançado pela primeira vez!), há muito material inédito. Uma das joias é “Drastic Plastic”, uma peça em duo, free impro para sax alto e baixo, que ocupa toda a face de um vinil e foi registrada em meados de 1964. O registro mais antigo vem de 1962 e é uma verdadeira curiosidade: traz o saxofonista sueco improvisando sobre/dialogando com “When Will The Blues Leave?”, peça do álbum “Something Else!!!”, de Ornette Coleman, que roda no toca-discos ao fundo. Para completar o box, há uma sequência de pequenas peças-tributos solistas executadas por diferentes nomes da cena free sueca, como Mats Gustafsson, Anna Högberg e Dror Feiler. O livreto que acompanha o box, de 32 páginas, traz extenso texto de apresentação de John Corbett. Há ainda como complemento um link de streaming para um filme com Nordstr​ö​m de 1973, dirigido por Torbjörn Ehrnvall. Com prensagem de apenas 300 cópias, Bengt "Frippe" Nordstr​ö​m - Vinyl Box chegou ao mercado na semana passada, dia 15 de fevereiro, vendido por cerca de 200 euros, e parece que já está praticamente esgotado. Imagino ser difícil prever a demanda por um material desse, mas fica a expectativa de uma nova prensagem e, por que não, uma edição em CD também.

 

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*quem assina:

Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Colaborou também com publicações como Entre Livros e Jazz.pt, de Lisboa. Nos últimos anos, tem escrito sobre música e literatura para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records), e “Live in Nuremberg”, de Perelman e Matthew Shipp (SMP Records)