TOP 10: Destaques de 2021


Encerramos o ano com nosso Top 10, listando álbuns imperdíveis lançados em algum momento de 2021, trabalhos que deveriam ser obrigatoriamente degustados pelos apreciadores da música livre e criativa...

 



Por Fabricio Vieira

 

Chegamos ao fim de 2021 com nosso Top 10. A ideia que motiva fazer anualmente uma seleção dessas é destacar álbuns que não deveriam deixar de ser ouvidos por quem se interessa por free music, discos incríveis que não podem passar em branco em suas audições. O universo free jazz/free impro continua nos trazendo grandes trabalhos ano após ano, com a música criativa, alternativa, independente mantendo seu vigor sempre vivo: difícil é escolher 10 discos; não faltaram empolgantes álbuns editados nos últimos 12 meses que poderiam ter entrado aqui... Mas a proposta é fazer uma lista de 10 discos (+ 2 extras, em "Gravação Histórica/Reedição" e "Disco Nacional do Ano"). Como costuma ser, o Top 10 do FreeForm, FreeJazz inclui discos lançados, em qualquer formato, durante o ano corrente, sendo considerados como candidatos à seleção apenas os que receberam 4,5 ou 5 estrelas quando resenhados. Boas audições!

 

TOP 10 - 2021

 

10- CHANTING IN THE NAME OF 

Luís Vicente Trio

Clean Feed

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Chanting In The Name Of
é o disco de estreia do trio comandado pelo trompetista Luís Vicente, ao lado de outras duas figuras centrais da cena free portuguesa, o baixista Gonçalo Almeida e o baterista Pedro Melo Alves. Tendo ganhado maior projeção de seus trabalhos na última década, esses três instrumentistas estão em seu melhor e a união de suas vozes não poderia ter ocorrido em momento mais propício, gestando um trabalho de grande maturidade expressiva. 




9- CORRE EL RIO DE LA MEMORIA SOBRE LA TIERRA...

Camila Nebbia Quartet

Ramble Records

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A saxofonista argentina Camila Nebbia, após o impressionante "Aura", de 2020, seguiu expandindo seus projetos neste ano, com diferentes destacados resultados. Aqui reuniu uma banda incrível com suas conterrâneas Paula Shocron (piano), Barbara Togander (voz e turntables) e Violeta Garcia (violoncelo). O álbum é uma inebriante, reflexiva e exploratória criação sonora, centrada em seu tema de abertura, com seus aproximados 37 minutos.

 




8- MIGRATION OF SILENCE INTO AND OUT OF THE TONE WORLD

William Parker

Centering Records/AUM Fidelity

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Destacando o perfil de compositor de William Parker, este box reúne nada menos que 10 CDs com música inédita, em um total de 91 faixas. A cada disco, uma nova obra, com uma nova formação, com boa parte delas tendo na voz feminina um importante elemento, sendo a maioria das letras/poemas também escritos por Parker - que, além de composições e arranjos, toca baixo, flautas, percussão, guembri, balafon... Um belíssimo painel de uma face de seu ímpar trabalho. 

 


7- COSMIC TRANSITIONS 

Isaiah Collier and  The Chosen Few

Division 81 Records

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Uma das surpresas do ano, o saxofonista de Chicago Isaiah Collier, de 23 anos, mostra com seu quarteto The Chosen Few que está com as ideias em ebulição. Com uma música diretamente conectada ao spiritual free jazz dos ano 60 e 70, Collier esbanja segurança para criar esta suíte em cinco partes. Seus explosivos solos ao sax soprano, impulsionados pela incandescente bateria de Michael Shekwoaga Ode, trazem a Cosmic Transitions uma energia única.

 


6- LULL

Jessica Pavone

Chaikin Records

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A violista Jessica Pavone aprofundou as experiências com composição para cordas que vêm desenvolvendo nos últimos. Liderando um octeto de cordas (mais as participações do trompetista  Nate Wooley e do percussionista Brian Chase), Pavone entregou uma obra cheia de camadas hipnóticas, drone, minimalismo, temas circulares, que vão nos engolfando em um processo de tensão e anestesiamento dos sentidos, se revelando uma experiência inebriante. 

 


5- LET THE FREE BE MEN 

Rodrigo Amado - This Is Our Language Quartet

Trost Records

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O saxofonista português Rodrigo Amado lançou três incríveis discos neste ano. Nosso escolhido foi este novo título do sensacional This Is Our Language Quartet, que traz a seu lado  Joe McPhee, Kent Kessler e Chris Corsano. O título Let The Free Be Men, extraído de um poema de E.M. de Melo e Castro, fala muito sobre nossos tempos. "Sinto que a música do disco tem uma maior ligação às raízes puras do free jazz e ao movimento dos anos 60, em que a música continha fortes conotações políticas", diz Amado.



4- NEW MASADA QUARTET

John Zorn

Tzadik

O tão aguardado disco de estreia no New Masada Quartet não decepcionou. Pelo contrário. Trazendo toda a inventividade que vem apresentando nos palcos desde 2018, o grupo comandado por John Zorn - com Julian Lage (guitarra elétrica), Kenny Wollesen (bateria) e Jorge Roeder (baixo acústico) - revisita clássicos do Masada Songbook em releituras únicas. Temas como "Hath Arob" e "Sansanah" mostram o quanto o som do quarteto pode ser contagiante.

 



3- SNARK HORSE 

Kate Gentile/ Matt Mitchell

Pi Recordings

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Um dos mais ousados projetos do ano, o Snark Horse uniu as forças da baterista Kate Gentile com o pianista Matt Mitchell em um incrível resultado editado em um box com 6 CDs. Um dos objetivos/desafios foi fazer um amplo caderno de composições que serviriam de base ao projeto, cada uma baseada em apenas um compasso. As peças, 70 no total, foram interpretadas por diferentes formações, de solos e duos a tenteto, em cerca de 5 horas de diversa, intensa e inventiva música.

 



2- JESUP WAGON 

James Brandon Lewis

Tao Forms

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O saxofonista James Brandon Lewis reuniu um potente time para montar o Red Lily Quintet: William Parker, Kirk Knuffke (corneta), Chad Taylor (bateria) e Chris Hoffman (violoncelo). Com este grupo, registrou sete composições suas e mostrou que está no auge de sua ascendente trajetória. Os diálogos e duelos com Knuffke, com quem ainda não tinha gravado, se revelam um dos pontos de relevo no desenvolvimento da obra.

 



1- THE CHICAGO SYMPHONIES 

Wadada Leo Smith's Great Lakes Quartet

TUM Records

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O lendário trompetista e compositor Wadada Leo Smith chega a seu 80º aniversário em incrível forma criativa. Editou em 2021 diferentes títulos, alguns realmente imperdíveis; dentre esses, as quatro The Chicago Symphonies. Mas uma vez, Smith se revela um dos compositores centrais da música contemporânea, acompanhado aqui dos geniais Henry Threadgill, John Lindberg e Jack DeJohnette (e Jonathon Haffner, no último dos quatro discos). Trabalho para se ouvir com reverência.

 



*Gravação Histórica/ Reedição

A LOVE SUPREME: LIVE IN SEATTLE

John Coltrane

Impulse!/UMe

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Registros ao vivo inéditos de lendários jazzistas surgem de tempos em tempos. Mas uma preciosidade como esta não é sempre. Com uma versão desconhecida de A Love Supreme registrada em 30 de setembro de 1965 em Seattle, esta raridade traz John Coltrane com seu quarteto reforçado por Pharoah Sanders e Donald Garrett. O grupo, que gravaria "Om" no dia seguinte, traz uma versão particularíssima do clássico máximo de Trane, que começava a adentrar a derradeira e mais explosiva etapa de sua trajetória.

 


*Disco Nacional do Ano

OUTROS ESPAÇO

Rodrigo Brandão

Selo Sesc

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Rodrigo Brandão se uniu ao lendário Marshall Allen para esta instigante empreitada. Acompanhados de outros membros da Sun Ra Arkestra e de artistas da cena criativa local (como Juçara Marçal, Thiago França, Thomas Rohrer e Guilherme Granado), Brandão e Allen comandam este baile interestelar cheio de liberdade improvisativa, com muito groove e linhas poéticas certeiras. "Mas enquanto isso, enquanto isso eu me pergunto: quantos Coltrane foram calado à bala (...) antes de emitir uma nota sequer de seus respectivos saxofones..."  

 



*Livro do Ano

UNIVERSAL TONALITY: The Life and Music of William Parker 

Cisco Bradley

Duke University Press


Cisco Bradley entregou aos entusiastas da free music algo há muito aguardado: uma biografia do gênio William Parker. Amparado por muitas entrevistas com Parker e gente próxima a ele, Bradley escreveu um livro em que aborda toda a trajetória do artista, desde seus primeiros contatos com a música, ainda criança no Bronx, até se tornar um dos maiores nomes da free music contemporânea, destacando seus principais projetos e parcerias. “Parker’s journey to many of the world’s premier jazz stages began from humble beginnings as a poor kid growing up in the South Bronx in the 1960s...”, diz a introdução.  

  



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*quem assina:

Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Colaborou também com publicações como Entre Livros, Zumbido e Jazz.pt, de Lisboa. Nos últimos anos, tem escrito sobre música e literatura para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records), e “Live in Nuremberg”, de Perelman e Matthew Shipp (SMP Records)