LANÇAMENTOs Em destaque, álbuns que serão editados nos meses de junho e julho. Experiências variadas, possibilidades múltiplas. Ouça, divulgue, compre os discos...
Por Fabricio Vieira
The Art Spirit ****
Michael Bisio/ Kirk
Knuffke/ Fred Lonberg-Holm
ESP-Disk
The Art Spirit reúne
um trio com uma formação realmente interessante: Kirk Knuffke (corneta), Michael
Bisio (contrabaixo) e Fred Lonberg-Holm (violoncelo e eletrônicos). O trio se
uniu em setembro de 2018 e entrou no Lone Pine Road, em Kingston (NY), para a
sessão que se transformou neste álbum. Vale notar que esta sessão é do mesmo
período da que resultou no inspirado "Requiem for a New York Slice",
que o trio editou em 2019. Dessa forma, não parece exagero pensar neste novo
registro como uma continuação daquele
– poderiam ter sido editados como um
álbum duplo, sem dúvida. A música do trio vai de temas quase letárgicos, como
"r. henri" e "Orange Moon", a faixas de grande rispidez, a destacar
a cortante "Not A Souvenir of Yeasterday", sempre em uma interação
precisa dos instrumentistas. O trabalho é inspirado e dedicado ao pintor norte-americano Robert
Henri (1865-1929).
Lançamento: 25 de junho, CD e digital.
Alterity Stream ****
Christopher Dell
ENW
O vibrafonista
e compositor alemão Christopher
Dell tem aqui um de seus mais ambiciosos projetos. Para a empreitada, foi reunido
um quarteto jazzístico com Dell, Theo Jörgensmann (clarinete), Christian Ramond
(baixo) e Klaus Kugel (bateria). A eles, seu uniu um camerístico quarteto de
sopros, com Camilla Hoitenga (flauta), Anja Schmiel (oboé), Berhard Kösling
(clarinete) e Christine Chapman (corne inglês). Esse grupo inusitado executa 15
peças de Dell, em cerca de uma hora de música. As composições foram ganhando
vida a partir de uma proposta de Jörgensmann anos atrás, para que Dell
escrevesse para seu quarteto. No final, o projeto se ampliou e se tornou mais
complexo e desafiador, culminante neste trabalho. A ênfase nas formações se alternam
com o decorrer das faixas: ora o foco é no quarteto de aura jazzística, ora no
camerístico, ora na união de vozes. A encantatória "Sandizet 2", por exemplo, une os
dois conjuntos para desenvolver as ideias propostas por Dell em uma combinação
bastante simbiótica. Já "Konturen C" e "Oleaster" focam mais o quarteto
jazzístico (com fulminante atuação solista de Jörgensmann), enquanto "Sentenzen",
o viés camerístico. Música além-fronteiras.
Lançamento: 11 de junho, LP, CD e
digital.
Churning of the Ocean ***(*)
Lee Ranaldo/ Jim
Jarmusch/ Balázs Pándi/ Marc Urselli
Trost Records
Está para sair um novo
capítulo desse projeto que uniu artistas famosos em torno de uma sessão de improvisação
livre. O guitarrista Lee Ranaldo (SY), o cineasta Jim Jarmusch (guitarra,
sintetizador), o premiado produtor Marc Urselli (baixo, laptop) e o baterista Balázs
Pándi editaram antes, em 2019, o bem-recebido
s/t. E este novo
Churning of the
Ocean vem da mesma época (não fica explícito se foi gravado proximamente,
provavelmente sim) e com uma proposta similar. São faixas de improvisação
climática, que parecem às vezes terem sido concebidas para compor a trilha de um
filme, com suas atmosferas etéreas e pontuais intervenções mais ríspidas. Não se
busca aqui explorar solos ou linhas temáticas detectáveis
– o que pode, se o
ouvinte se descuidar, acabar por jogar a música para o "fundo", algo que com certeza os instrumentistas não desejariam. Gravação
"live" feita no EastSide Soun Studio, que Urselli mantém na downtown
nova-iorquina, apresenta quase 50 minutos de música. O disco traz quatro peças,
duas breves ("Tectonic Mantle" e "Night of Webs") e duas mais
extensas ("Infinite Rain" e "Quivering Air")
– há o bônus
"Threshing Fields" na versão CD.
Lançamento:
11 de junho, LP, CD e digital.
Like One Long Dream ****(*)
Mofaya!
Trost Records
Mofaya! é um novo quarteto que reúne os norte-americanos John Dikeman (sax), Jaimie Branch (trompete) e Luke Stewart (baixo, do Irreversible Entanglements) ao sérvio Aleksandar Skoric (bateria). O projeto, comandado por Dikeman (que vive na Holanda), ganhou corpo no ano passado e agora chega a essa sua sólida estreia. O quarteto apresenta três longos fulminantes temas, com 7, 18 e 27 minutos, nos quais os diálogos de sax e trompete assumem certo protagonismo, catapultados pela intensa pulsação gestada por Stewart e Skoric
– este, um baterista de pegada muscular, daqueles cujas batidas reverberam no corpo. Trata-se aqui de
energy music, que parece por vezes chegar a aquecer o ar
– Dikeman e Branch se mostram especialmente explosivos na abertura de Wake Up!, faixa de ideias mais concentradas que fecha o álbum. Fica a expectativa de que o quarteto não tenha sido apenas uma experiência de único registro; há muito potencial no projeto.
Lançamento: 25 de junho, LP, CD e digital.
Blue Reality Quartet ****(*)
Joe McPhee/ Michael
Marcus/ Jay Rosen/ Warren Smith
Mahakala Music
Este novo projeto de
artistas veteranos começou a surgir em 2018, quando o clarinetista Michael
Marcus e o baterista Jay Rosen estavam em turnê pela Áustria. O que era a
princípio para ser uma apresentação em duo, sofreu a intervenção do produtor do
Jazzgalerie Nickelsdorf, que sugeriu que Joe McPhee se juntasse a eles. Não
satisfeito, teve nova ideia para o concerto: porque não adicionar outra
bateria? A proposta funcionou e, no ano passado, se uniram novamente para a
gravação deste álbum de estreia do Blue Reality Quartet (contando agora com a
entrada de Warren Smith, que não estava no show na Áustria). A formação de dois
sopros e duas baterias é excitante por si só e sendo estes os músicos
envolvidos difícil não sair algo potente. O resultado são sete faixas, distribuídas
em aproximados 40 minutos. O disco abre de forma bem relaxada, com um
vibraphone (Smith) demarcando as linhas em "Love Exists Eveywhere". A
potência cresce em outros temas, como em "Joe's Train", que traz
alguns dos momentos mais cativantes do álbum, a destacar os solos de McPhee.
Lançamento:
16 de julho, CD e digital.
Cool With That *****
East Axis
ESP-Disk
East Axis é um quarteto
que reúne Matthew Shipp (piano), Allen Lowe (saxes alto e tenor), Kevin Ray
(contrabaixo) e Gerald Cleaver (bateria). Gravado em meio à pandemia, em agosto de 2020
no Park West Studios, no Brooklyn (NYC), o disco traz cinco peças de grande
força expressiva. Estamos aqui no terreno do free jazz, onde, mesmo que os
músicos desfrutem de ampla liberdade, não escondem suas heranças sonoras. A
peça de abertura, "A Side", traz Shipp incrivelmente inspirado, criando
linhas hipnóticas impulsionado pelo toque sutilmente envolvente de Cleaver e o
aconchegante sax de Lowe. Em "Oh Hell I Forgot About That" a energia é triplicada, com Shipp esmagando o piano como não se via há tempos. Já
"Social Distance", na sequência, baixa o tom, ganhando um ar quase soturno,
em sintonia com esses tempos sombrios que vivemos.
Cool With That surge como um
dos discos imperdíveis do ano. “
I am always looking for new situations to renew who I am
and the language I am involved with - this group has allowed me to reboot my
brain. Allen is a unique figure, who is unlike anyone I play with in any other
situation. Kevin has a delicious cross section of experience over several
genres that gives him a different look than a bassist who might be seen as the
usual in the idiom. Gerald is different now because he has had such a deep
and cross section of experiences since then", diz Matthew Shipp.
Lançamento: 25 de junho, CD e digital.
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*quem assina:
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e
Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos;
foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Colaborou também com
publicações como Entre Livros, Zumbido e Jazz.pt. Nos últimos anos, tem escrito
sobre música e literatura para o Valor Econômico. É autor de liner notes para
os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), “The Hour of
the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records), e “Live in Nuremberg”, de
Perelman e Matthew Shipp (SMP Records)