Play it again... (duos e trios)






LANÇAMENTOS Apanhado de novidades da free music.
Música criativa de diversos cantos, múltiplas possibilidades.
Ouça, divulgue, compre os discos.







Food  ****(*)
Duot & Andy Moor
Repetidor

O duo catalão Food – Albert Cirera (saxofone) e Ramón Prats (bateria) – se une ao guitarrista Andy Moor (The Ex, Lean Left) neste empolgante álbum captado em dezembro de 2015. São sete temas próprios, com Moor trazendo novo colorido ao duo. Há momentos realmente faiscantes, em que algo da vivência rock de Moor pode chegar a ser sentida. Momentos mais contemplativos também soam aqui e ali, como nas mais centradas, arrastadas e detalhistas “Slow Food” e “Bass Cabinet”. E entre essas duas está “Arrebato”, que começa com a guitarra em primeiro plano e mergulha em um dos mais incandescentes momentos. Com sax e bateria em modo ebulição em parte significativa da música apresentada, a guitarra de Moor se torna um aditivo precioso, com seu toque particular levando o som do duo a novas possibilidades – talvez “It’s Your Business” seja o melhor exemplo da proposta deste encontro imperdível. Edição digital e em vinil.






3 **** 
Things to Sounds
Wide Ear Records

Em seu terceiro álbum, o jovem trio suíço Things to Sounds concentra as energias em um único longo tema de improvisação livre, de 42 minutos, captado ao vivo no Limmitationes Festival, na Áustria, em maio de 2016. Tendo estreado em 2010, o Things to Sound é formado por Tobias Meier (sax alto), Yves Theiler (piano, sintetizador) e David Meier (bateria, que fazia parte do interessante Trio Riot, ao lado de Mette Rasmussen). O disco abre com sax e piano dedilhando com cuidado os caminhos a serem percorridos, ganhando potencialidade com o passar dos minutos. Apenas depois de percorridos uns nove minutos é que a música ganha maior robustez, processo que se sustentará por um tempo até termos nova baixa de intensidade, com os instrumentos tateando ruidosidades cá e lá. Um intenso diálogo entre piano e sax marca o fim dos 20 minutos, antes de partirem para a arrancada da etapa final, em que o solo de piano se destaca. Todos os três músicos estão na casa dos 30 anos, fazendo parte de uma geração que tem dado novo alento à free music europeia.







Oneness  **** 
Carrier/ Lambert/ Mazur
FMR
Este é o terceiro capítulo do trio liderado pelo canadense François Carrier (sax alto e oboé chinês) que conta ainda com o polonês Rafal Mazur (bass guitar) e Michel Lambert (bateria). Como seus antecessores “Unknowable” e “The Joy of Being”, o álbum foi registrado no Alchemia Jazz Klub, na Cracóvia, e funciona como uma série contínua em três volumes, mesmo que os títulos não indiquem isso. Oneness é, na realidade, o lado B de “The Joy of Being”, tendo sido captado em um show no dia seguinte daquele, em 25 de maio de 2015. Assim, poderiam ser ouvidos sequencialmente, como uma longa apresentação. A improvisação livre é o foco do trio e os cinco temas soam fluidos e coesos, resultado de um grupo que tem boa sintonia e já dividiu o palco em diferentes oportunidades. Encerrado esse capítulo (ao que parece), seria interessante ouvir Carrier e Lambert tocando com novos parceiros ou em duo mesmo, algo que eles têm feito menos nesses tempos.







Triptych  ****
Ken Vandermark/ Michael Thieke/ Tim Daisy
Relay Recordings

O baterista Tim Daisy comanda este novo projeto, “Triptych”, para o qual convidou o saxofonista Ken Vandermark e o clarinetista alemão Michael Thieke. Este álbum de estreia foi captado no Experimental Sound Studio, na Chicago de Vandermark e Daisy, e mostra o trio explorando oito temas, entre três composições do percussionista e outras faixas de free impro. “At Argyle” abre o trabalho com cativante tema de sabor jazzístico que salta de um sopro ao outro. Esse esquema se mantém nos outros dois temas criados por Daisy – “Yellow  Fern” e a quase-balada “Tuesday at Noon” –, que são intercaladas pelas improvisações livres nas quais os músicos se alternam, como indicam as iniciais das faixas: “KV-MT”, com duo de Vandermark e Thieke; “TD”, com solo de Daisy; “KV”, com solo de Vandermark, e assim por diante (faltou apenas o duo KV-TD!). Saboroso e descontraído encontro.






Bright Yellow with Bass  ***(*)
Heath Watts / Blue Armstrong
Leo Records
Recém-editado pelo Leo Records, Bright Yellow with Bass é um encontro entre sax e baixo. Heath Watts, pouco lembrado músico norte-americano de Montana, seguiu as trilhas de Steve Lacy e se especializou no sax-soprano; para este duo, convidou o veterano baixista Blue Armstrong. Partindo do título e da capa, nota-se o quanto as cores (o amarelo-sol, em especial) são uma inspiração viva; a dupla trabalha tendo o contraste como ponto de partida: o sax representando o amarelo brilhante em oposição ao som mais denso e escuro do baixo. São 10 improvisações registradas em uma zona de tranquilidade, nas montanhas de Montana. Mas a música não soa plácida, pelo contrário, tendo até temas mais ariscos, como “Adhocery”, que abre o conjunto, e especialmente “Every other one is every bit other”, com o mais potente solo de Watts. Uma interessante e fresca contribuição para esse envolvente formato.






Interzones 1  *****
Franziska Baumann / Christoph Baumann
Leo Records

Instigante duo suíço que reúne Franziska Baumann (voz, eletrônicos) e Christoph Baumann (piano, piano preparado) em 10 explorações multifacetadas de grande inventividade. Aqui estamos em um terreno em que bifurcam experiências do free impro e do erudito contemporâneo em desafiadoras peças em que voz, piano e eletrônicos penetram áreas muito mais amplas do que o costumeiramente explorado em um duo com essa formação. “Puls 105” abre o álbum com piano preparado e eletrônicos preparando os ouvidos para os desafios sonoros que vêm depois; trabalhando com esferas fonêmicas, a voz de Franziska chega brilhantemente aos poucos. Daí passamos à sombria e hipnótica “Coming into Things” e à mais lírica “Fixed after your hand and purpose” (notem as esferas do canto visitadas; tal clima retorna na faixa final, “Part I...”). Christoph mostra o seu melhor como pianista em “Daily Entropy”, enquanto “Elektrofunkel” explora as vias da seara eletroacústica. Em seus 10 coesos mas muito diversificados temas, Baumann & Baumann apresentam um registro realmente excitante e desafiador.








------------
*quem assina:
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Atualmente escreve sobre livros e jazz para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), e “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records)