LANÇAMENTOS Destaques de álbuns que trazem cordas em papel protagonista, editados
nos últimos tempos.
Experiências em várias formas.
Ouça, divulgue, compre os discos.
Some Poems ****
Elisabeth Coudoux
Leo Records
A violoncelista alemã Elisabeth Coudoux, um das quatro vozes do The
Octopus, aparece aqui em projeto solo. Neste seu disco de estreia, alternando
improvisação e composição, Coudoux consegue exibir uma ampla gama estética, que
reflete sua formação e percurso. Celista clássica, passou pelo conservatório
Carl Maria von Weber, em Dresden, onde desenvolveu uma tese sobre o violoncelo
no jazz. Sua música traz tudo isso junto ou variando de um tema a outro. A primeira
peça (“A Faint Voice”), por exemplo, traz um mais marcado sabor de música de
câmara. “Found Not”, na sequência, nos leva para outros campos exploratórios,
com seu estranho e fraturado tempo.
Já “In Sounding Bodies” carrega certo
minimalismo hipnótico, com o violoncelo ecoando sobre ele mesmo, como se houvesse mais de um instrumento em ação – difícil não pensar na série “Phase”, de
Steve Reich. “Besets” traz outro
enfoque, agregando ruidosidade ao conjunto.
Poemas inspiradores.
SololoS ***(*)
Irene Kepl
Fou Records
A violinista austríaca Irene Kepl, que estudou música clássica e jazz, apresenta seu primeiro disco solístico, com 12 temas próprios,
gravados em uma única sessão em março de 2016. O foco aqui é a improvisação
livre e Kepl mostra que conhece profundamente os caminhos do instrumento que
executa. Tocando um violino de 1797, Kepl faz música contemporânea altamente
pessoal, utilizando técnicas expandidas e pesquisa microtonal, podendo também
soar liricamente melódica (“Lucid”). Dentre os resultados mais surpreendentes
estão a minimalista “AmiNIMAL” (a mais extensa de todas, com seus 11 minutos), “Walzer
on the Roof” (com suas marcantes repetições agoniantes) e “Move Across” (quase
imperceptível de tão sussurrada).
Raw ****
Trio Kimming-Studer-Zimmerlin + John Butcher
Leo Records
O saxofonista britânico John Butcher é aqui um convidado do
trio que reúne Harald Kimmig (violino), Daniel Studer (baixo) e Alfred
Zimmerlin (violoncelo). Improvisação livre com muita sutileza e pontos de temperatura
mais elevada é o que o quarteto oferece em 4 faixas gravadas em Munique em
janeiro de 2015, no que foi o primeiro encontro entre eles. “A Short Night with a Light Beam of the Moon”,
que abre o disco, é a mais extensa (17 minutos) e sintomática do trabalho do
quarteto. Após crescer rapidamente, atingindo seu pico com o sax tenor em
primeiro plano entre os 2 e 4 minutos, a
peça adentra um campo sussurrante, onde os ouvidos são convocados a ter atenção
extra, com os detalhes trilhando o desenvolvimento do tema. Isso vai até os 11
minutos, quando o tenor retorna a primeiro plano, com a força característica de
Butcher. Essa ondulação de alturas marca o álbum como um todo, apesar de o tom mais contemplativo
imperar. Para ser ouvido sem distrações.
Subzo[o]ne ****(*)
The Octopus
Leo Records
O quarteto de cordas é um dos formatos mais explorados na
música erudita, com obras-primas gestadas em diferentes séculos. Mas um
quarteto de violoncelos é algo mais raro de se ouvir. The Octopus é exatamente
um quarteto de violoncelos nascido na Europa que agora apresenta seu primeiro
registro, Subzo[o]ne. Formado em 2013 em Colônia (Alemanha), traz Elisabeth Coudoux, Nathan Bontrager, Nora
Krahl e Hugues Vincent, todos com formação clássica e experiência no universo
da improvisação livre. Em sua apresentação, o quarteto diz: “We have eight arms,
but four brains. (...) these arms come from different places with different
backgrounds. One arm plays jazz, one plays Bach, another Boulez... but they all
improvise and they all listen and work together”. Ou seja, o mesmo instrumento
explorado em ideias múltiplas. Isso fica bem marcado nas 14 peças que compõem o
álbum, com variadas durações (de 29 segundos a 6 minutos) e propostas
exploratórias. Subzo[o]ne tem achados
realmente fantásticos, como o denso tema de abertura, “When Octopus Killed
Crumpet”, a sombria “Federschwarm” e a ironicamente tiulada “In the Mirkwood
Jazz Club” (que não tem nada de jazzística). Apesar de tratar-se de música
improvisada, o resultado parece cuidadosamente composto, dada a perfeição
harmônica e o sensível equilíbrio alcançado, em que o quarteto soa sempre como
um grupo de quatro vozes em diálogo telepático.
*quem assina:
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em
Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por
alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Atualmente
escreve sobre livros e música para o Valor Econômico. Também colabora com a
revista online portuguesa Jazz.pt.
É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de
Roscoe Mitchell (Selo Sesc), e “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo
Records)