Peter Evans: trompete sem limites






ENTREVISTA  O trompetista Peter Evans se apresentará pela primeira vez no país, passando por São Paulo, Rio e Belo Horizonte. Antes de desembarcar por aqui, ele conversou com o FreeForm, FreeJazz...


  

A trajetória de Peter Evans está intimamente ligada à cena free e avant-garde de Nova York, onde se estabeleceu a partir de 2003. Com pouco mais de 20 anos, o trompetista chegou a NY após se graduar no Oberlin Conservatory of Music, em Ohio. Dono de técnica apuradíssima – que muito levou também a interpretações no universo erudito contemporâneo e barroco –, Evans tem criado uma linguagem muito particular, explorada em seu limite nas gravações e concertos para trompete solo que têm desenvolvido há mais de uma década. No Brasil, Evans se apresentará exatamente em formato solista.

O primeiro álbum editado pelo músico, More is More, em 2006, foi um disco solo, no qual ele toca trompete e picolo trompete. É possível ouvir sua arte solística também nos álbuns Nature/Culture (2009) e Beyond Civilized and Primitive (2011). Mas essa é apenas uma face de sua arte – o envolvimento de Evans com diferentes projetos já rendeu algumas dezenas de álbuns. Em 2007, Evans lançou um elogiado álbum liderando seu Quartet, que contava com Tom Blancarte, Kevin Shea e Brandon Seabrock. Formaria também um trio com Mary Halvorson e Weasel Walter; um duo com Nate Wooley; o Rocket Science com Evan Parker, Craig Taborn e Sam Pluta; o Zebulon Trio; o Pulverize the Sound; além da participação, encerrada há pouco após mais de uma década, no Mostly Other People do the Killing – dentre outros grupos e parcerias. Mas provavelmente seu projeto mais bem-sucedido é o “Peter Evans Quintet”, cujo primeiro álbum, editado em 2011, foi unanimidade nas listas dos melhores do ano.

Em conversa por e-mail com o FreeForm, FreeJazz no começo desta semana, o trompetista preferiu não falar sobre o passado (sua formação, a integração na cena de NY, projetos encerrados), mantendo o foco no que está acontecendo hoje, “um pé no agora e outro no futuro”, em um momento em que está especialmente concentrado no Quintet e no seu trabalho solo.




Você fará apenas concertos solos em sua turnê pelo Brasil. Que tipo de ideias você explora como solista? Como seu enfoque nesse projeto solo se difere das outras músicas que tem criado ao longo dos anos?

"Eu pretendo ser um contador de histórias, criar um espaço coletivo em que haja uma experiência intensa e expressiva para todos. O que tento é passar uma mensagem que está além da linguagem, que aponta para uma realidade maior e mais profunda. Este objetivo não é diferente quando realizo meus outros trabalhos."



Você tem tocado em uma grande variedade de diferentes grupos e projetos. Gostaria que falasse sobre os atuais projetos, o que tem feito e que virá depois.

"Cada projeto tem sua vida própria. Meu foco atual está no trabalho solo e no Quintet. Os outros grupos têm seu momentum coletivo próprio. É importante não me dividir muito, então estou fazendo o certo em me concentrar no que está à minha frente. Este é um problema real de Nova York – fazer coisas demais sem foco – e estou tentando não cair nessa armadilha."  


Há planos de gravações novas com o Zebulon Trio?

"O Zebulon tem algumas gravações bacanas ao vivo feitas no ano passado. Esta realmente é uma live band, por isso, se vier um novo álbum virá de um concerto ou uma turnê. Estou pensando sobre isso, mas há muitas gravações na fila para serem editadas e lançadas. Esperamos que em 2017 saia o próximo [disco] do Zebulon."

 

Pode descrever o processo composicional empregado por você, Mike Pride e Tim Dahl no Pulverize the Sound? Há muitos estilos musicais envolvidos nisso?

"Todos nós escrevemos individualmente as peças, a maioria usando uma notação padrão. Elas são então organizadas e concretizadas nos ensaios, para depois de algum tempo serem tocadas [em público]. Quando componho para este grupo, minhas ideias costumam ser muito duras e abstratas. Eu sempre estou certo de que Mike e Tim irão adicionar muita energia e vibração e que isso vai soar visceral nas apresentações. Isso me permite escrever coisas que no papel são um pouco áridas, mais que o normal. É um processo muito interessante. Quando preparamos novas músicas ensaiamos muito, mas focados no material que escrevemos. E a improvisação nasce nos concertos e flui por si mesma."



Que parcerias foram particularmente importantes em seu desenvolvimento artístico desde que chegou a Nova York?
"Eu sempre aprendo algo com todos. Mesmo as experiências ruins são instrutivas. Minhas experiências com Evan Parker, Dave Taylor, Hamid Drake, Craig Taborn, Steve Schick, John Zorn, Sam Pluta, Tyshawn Sorey, Weasel Walter foram bem formativas."


Você já tocou com Peter Brötzmann (que também se apresenta no Brasil em julho): o que pode contar sobre essa experiência?

"Eu participei de uma pequena série de concertos com o Full Blast + Keiji Haino e Mars Williams no outono de 2008. Foi uma experiência inspiradora. Peter é um bandleader generoso e eu aprendi muito tocando com Keiji e Mars. Essa foi uma experiência original para mim e me sinto sortudo de ter tido essa oportunidade. O concerto que fizemos em Berlin foi lançado pela Okka Disk [“Crumbling Brain”] e há um duo, com o Keiji (nos vocais) e eu, que foi realmente especial."   



Como vê a relação entre som, espaço e performance?

"O papel do músico criativo é tentar unir esses elementos em um momento expressivo comunitário. Abrir uma janela para algo além do real durante um breve tempo.



Poderia citar cinco álbuns que tiveram grande impacto para você enquanto músico?

Captain Beefheart: “Trout Mask Replica”
John Coltrane: “Transition”
Evan Parker: “Six of One”
Miles Davis: “Star People”
Umalayapuram K. Sivaraman: “Garland of Rhythm”



O que vem por aí?

"Estou tentando simplificar minha vida musical, bem como explorar novas opções. Meu trabalho com o Quintet e as performances solos são o principal; estou lançando quase duas horas de gravações feitas no outono e planejando muitos concertos. O Quintet e o trabalho solo estão em um momento de desenvolvimento acelerado, então estou discutindo muitas ideias, praticando, pensando sobre novas possibilidades. Em um nível prático, estou preparando várias turnês para 2017 e 2018, que demandam muito planejamento e coordenação. Gostaria de adicionar mais gente ao Quintet e estou à procura das figuras certas. Começando com esta viagem ao Brasil (que tem sido relativamente calma até o momento), vou ficar muito ocupado, com compromissos em Portugal, Austrália e depois toda a Europa. Estou apenas tentando me preparar para tudo isso, ter um pé no agora e outro no futuro."








**PETER EVANS (solo concert)**


Quando: 17/7 (dom), às 18h
Onde: Sesc Palladium (BH), no sô(m): Encontro Internacional de Arte Sonora
Quanto: R$ 5 a R$ 10 

Quando: 18/7 (seg), às 20h
Onde: Audio Rebel (RJ)

Quando: 21/7 (qui), a partir das 20h
Onde: Sesc Consolação (SP), no FIME (Festival Internacional de Música Experimental)
Quanto: R$ 5 a R$ 17 




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*quem assina:
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado na área literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Atualmente escreve sobre literatura e jazz para o Valor Econômico. E colabora com a revista online portuguesa Jazz.pt.
É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), e “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records)