Norris Jones. Era com esse nome que o baixista, conhecido
depois no meio free como Sirone, participava de gigs em seus primeiros tempos.
Ainda em sua Atlanta natal, tocou jazz com George Adams e R&B com Sam
Cooke. Mas seria a mudança para Nova York, em 1965, que selaria seu destino
como um dos mais destacados e requisitados baixistas do free.
ao Untradicional Jazz Improvisational Team, que o pianista
Dave Burrell organizava então. O grupo contava ainda com o saxofonista Byard
Lancaster e abriu um novo universo a Sirone. Logo seu nome apareceria em gravações como“Three
for Shepp” (Marion Brown, 67), “In Search of the Mistery” (Gato Barbieri, 67) e
“Black Woman” (Sonny Sharrock, 69). Mas o melhor viria nos anos 1970. No começo
dessa década, se uniu a Leroy Jenkins (violino) e Jerome Cooper (bateria) para criar
um dos mais destacados grupos da free music, o Revolutionary Ensemble, com sua formação
pouco usual e sonoridade ímpar. O trio lançaria discos fundamentais, como
“Vietnam” (72) e “The Psyche” (75). Ainda nos anos 1970, Sirone gravou com nomes importantes da cena, como Cecil Taylor (“Live in The Black Forest”,
“3 Phasis”), Dewey Redman (“Coincide”) e Clifford Thornton (“Communications
Network”), além de trabalhar com Ornette Coleman em 1974. Antes de acabar a
década, o baixista faria sua estreia como líder.
Nos anos 1980, Sirone se uniu a seu antigo amigo George
Adams, a Rashied Ali e a James ‘Blood’ Ulmer para formar o “Phalanx”, quarteto
de free jazz que lançou dois saborosos trabalhos, “Original” (1987) e “In
Touch” (1988), antes de desaparecer precocemente. Participaria ainda nesse
período também dos discos de estreia do saxofonista Charles Gayle (“Homeless” e
“Always Born”). Apesar da boa safra, o músico decide se mudar na época para Berlim, onde
viveria até sua morte, em outubro de 2009. A última gravação editada com Sirone nos créditos
foi “Infinite Flowers”, feita em trio ao lado de Sabir Mateen e Andrew Barker. O
disco, que captou um encontro em junho de 2008 no Brooklyn, NY, saiu em 2013.
Apesar de ter participado de dezenas de álbuns, Sirone pouco
deixou de registros como líder. O primeiro desses escassos exemplares,
Artistry, data de 1978, tendo aparecido pelo desconhecido selo “Of the Cosmos” – provavelmente
criado pelo próprio artista para editar o álbum –, pouco depois do fim do
Revolutionary Ensemble. Nesse álbum de estreia como líder, que nunca recebeu
uma versão em CD, Sirone reuniu um quarteto com uma instrumentação pouco comum:
baixo, flauta, violoncelo e percussão.
© Bernd Mast |
“I wanted to do something completely different than what I
did with the Ensemble but I wanted another sound not with the traditional
instruments you hear in the music and I thought of a flute but I did not want a
saxophone player who doubled on the flute, I wanted a flautist”, declarou o
músico sobre o grupo com que gravou este Artistry.
A sonoridade deste álbum não chega a ser oposta ao que ele vinha fazendo com o Revolutionary
Ensemble, um free com certo de ar camerístico – a proximidade fica mais
explícita nas passagens em que ouvimos apenas cordas e percussão. Não que os
resultados sejam similares, há uma nova proposta, mas carregam um espírito que
os aproxima e faz com que dialoguem e estabeleçam laços. O quarteto de Artistry
mesclava experiência e olhares novos: enquanto na bateria estava Famoudou Don
Moye, há uma década (naquele momento) segurando a percussão do Art Ensemble of Chicago, na flauta estava James Newton, que contava
com apenas 25 anos. No violoncelo, o menos conhecido Muneer Bernard Fennell
(que assinava na época Muneer Abdul Fatah), que chegou a gravar com Jimmy Lyons
e Ahmed Abdullah e, de forma discreta, se mantém na ativa até hoje. Artistry
está dividido em quatros temas, dois em cada face do vinil. “Breath of Life” e “Circumstances” trazem os momentos
maiores do conjunto. “Breath of Life abre com uma longa introdução de baixo solo,
interrompida pela brusca entrada da flauta, que passa a conduzir uma errática melodia,
com a faixa crescendo lentamente. “Circumstances”, após uma abertura arrastada,
desemboca em um tema mínimo e circular cantado pela flauta e ecoado pelas
cordas, que inebria a escuta e faz os ouvidos buscarem-no uma vez mais quando
desaparece em meio a outros caminhos explorados pelos instrumentos, que
culminam com o embate entre violoncelo e baixo nos últimos minutos da peça.
Especialmente após a morte de Sirone, parece muito pouco
provável que alguém resolva reeditar esse álbum – nas lojas virtuais, às vezes
aparece um exemplar, normalmente custando em torno de US$ 50. Mais um título
esquecido do free jazz, que merece ser descoberto por quem se interessa pela
música livre.
“Artistry”
A1. Illusions of Reality
A2. Breath of Life
B1. Circumstances
B2. Libido
*Sirone: bass
*James Newton: flute
*Muneer Bernard Fennell: cello
*Don Moye: percussion
Recorded at Generation Sound, NYC, July, 1978.
Free Jazz Underground é uma série que busca resgatar e
apresentar álbuns esquecidos, nunca reeditados, de artistas que, de alguma forma, contribuíram para o desenvolvimento da música livre.