10 trompetistas que estão esquentando a cena contemporânea


Talvez não seja exagero afirmar que o trompete é o grande instrumento da cena contemporânea. Em meio a variadas expressões do jazz ao free impro, uma série de músicos que surgiram e/ou sedimentaram sua arte neste século XXI têm revitalizado o instrumento e ampliado suas potencialidades. Dentre tantos mundo afora, destacamos  10 nomes que deveriam ser descobertos e ouvidos com atenção por quem se interessa pela música criativa feita hoje.







"PETER EVANS"


(Andy Newcombe)
Nome central da cena contemporânea, Peter Evans tem se dividido entre diferentes sensacionais projetos, a destacar seu “Quintet” e o “Zebulon Trio”. Após se formar no Oberlin Conservatory of Music, em Ohio, Evans se estabeleceu em Nova York, onde tinha um ambiente mais promissor para a música em que estava interessado. Depois de lançar seu álbum de estreia, o disco solo “More is More”, em 2006, no qual apresentou sua sonoridade muito particular, explorando técnicas expandidas em busca de territórios ainda pouco desenvolvidos pelos trompetistas, não tardou a se estabelecer. Ganhando rápida e crescente atenção, logo estaria gravando com o lendário Evan Parker e editando discos de destaque. Em 2011, com seu quinteto, lançou o fantástico “Ghosts”, encabeçando várias listas de melhores do ano. Com seu trio, gravou em 2013 outro brilhante exemplar, “Zebulon”, no qual mostra uma enérgica pegada free jazzística. Solo, trio, quarteto, quinteto: não faltam versões da arte de Peter Evans para serem apresentadas em nossos palcos. Ninguém se habilita a trazê-lo?







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"NATE WOOLEY"


(Peter Gannushkin)
 
No ano passado, Nate Wooley trouxe seu quinteto para se apresentar no Jazz na Fábrica – sendo esse seu projeto que mais carrega elementos jazzísticos, mas com uma visada contemporânea, com muita liberdade harmônica e rítmica. Para quem o viu em ação naquela ocasião, vale lembrar que seu  trabalho vai muito além do que nos apresentou: com algumas dezenas de discos editados, o trompetista dá muita ênfase à improvisação livre, tendo em discos solísticos e em duos (como os com Peter Evans, Taylor Ho Bynum e o recente encontro com Ken Vandermark) importantes veículos utilizados para explorar os limites do instrumento.  







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"NIKLAS BARNÖ"

Representante da nova geração do free sueco, Niklas Barnö passou a chamar atenção quando a Ayler Records editou, em 2010, o disco de seu trio “Snus”. Mais recentemente, Barnö se juntou à trupe da “Fire! Orchestra”, sob comando de Mats Gustafsson. Também pode ser ouvido no quarteto “The Jolly-Boat Pirates”, além de comandar o grupo “Je Suis!”. Desenvolvendo uma música de melodias simples e ataques intensos, Barnö já foi apontado como devedor do melhor Ayler. O sueco parece estar mais focado na cena de sua região e ainda não recebeu a atenção que merece.




(Niklas Barnö e o trio “Snus”. Paris, 2012)





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"SUSANA SANTOS SILVA"


O free jazz contou em seus primeiros tempos, ainda nos anos 60, com uma trompetista: Barbara Donald. Mas as mulheres parece que preferiram dar preferência ao saxofone para se expressarem. Todavia, há exceções, como a portuguesa Susana Santos Silva. A trompetista, vinda do Porto, tem nos últimos anos se envolvido cada vez mais em projetos variados e desenvolvido uma linguagem improvisativa bastante particular. Susana parece se interessar especialmente por formações pequenas, como duos (mantém parcerias nesse formato com a pianista Kaja Draksler, o baixista Torbjorn Zetterberg e o percussionista Jorge Queijo), estando também à frente do trio Lama, com o qual já editou dois álbuns.







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"JONATHAN FINLAYSON"
(Peter Gannushkin)
Jonathan Finlayson se tornou conhecido por suas colaborações com grupos como “Five Elements”, do saxofonista Steve Coleman, e o quinteto da guitarrista Mary Halvorson. O músico, nascido em 1982 em Berkeley, também participou no ano passado do elogiado álbum “Mise in Abime”, no octeto comandado por Steve Lehman. Como líder, Finlayson estreou em 2013 com o incensado disco “Moment and the Message”, no qual exibe sua face de compositor e mostra sua sonoridade sem arestas, lírica e encorpada na medida.


(Jonathan Finlayson; Ches Smith; Stephan Crump - The Stone, NY, 2012)





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"LUIS VICENTE"

O trompetista português Luis Vicente teve em 2014 um ano especialmente forte, lançando três álbuns que demonstram a amplitude de seu trabalho: o genial “Clocks and Clouds”; “Zero Sum”, com o quinteto Fail Better!; e “Opacity”, novo duo com Jari Marjamaki. Dividindo seu tempo entre esses e outro projetos, Vicente – músico de toque centrado, quente sem ser explosivo – tem ocupado lugar de destaque na viva e intensa cena portuguesa.







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"TAYLOR HO BYNUM"

(Peter Gannushkin)
Muito associado a Anthony Braxton (com quem veio ao Brasil no ano passado), Taylor Ho Bynum é um dos grandes exploradores dos limites do instrumento. Tocando de corneta a flugelhorn, comanda um sexteto/septeto (com o qual editou um dos melhores discos de 2013, “Navigation”) e divide seu tempo com múltiplas parcerias, como o duo com o baterista Tomas Fujiwara e o trio “Book of Three”, com John Hébert e Gerald Cleaver. Vale destacar ainda seu projeto “The Acoustic Bicycle Tour”, com o qual viajou sozinho pela costa norte-americana entre agosto e outubro passado, de bicicleta, parando e tocando com músicos nas cidades em que foi passando. Voz fundamental que deveria já ter sido convidado a exibir sua arte por aqui.






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"ROMULO ALEXIS"

Radicado em São Paulo, Romulo Alexis tem sido importante protagonista do “Circuito de Improvisação Livre” – série de eventos fundamental para manter a cena local ativa e produtiva. Alexis mostrou toda a amplitude de suas pesquisas no ano passado, com o disco solístico “Phylum”, no qual testa uma variedade de boquilhas, surdinas, microfones e objetos outros para concretizar treze temas com uma ampla gama de resultados. Está na hora dele ter a oportunidade de mostrar seu trabalho em outras praças, levar sua música além-mar...






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"GREG KELLEY"

Técnicas expandidas, manipulação eletrônica e muita ruidagem formam a base da criação de Greg Kelley. Uma das vozes mais dissonantes da improvisação livre atual, Kelley tem trabalhado com gente como Paul Flaherty, Chris Corsano e Jason Lescalleet. Mas foi com suas intervenções solísticas que, de fato, chamou atenção. Em 2000, editou seu primeiro trabalho de destaque, “Trumpet”, no qual investigava o instrumento em um leque amplo de ruidosidades, ora agressivas ora inebriantes, sempre de forma abstrata – o trabalho foi recebido de forma díspar: Piero Scaruffi escreveu: “(The album) could have the impact and the significance that Anthony Braxton's Saxophone Improvisations had in the 1970s”. Já Steve Loewy deu, no All Music, apenas duas estrelas para o disco... Com Kelley, o trompete está completamente dissociado de sua herança jazzística: são outros universos sonoros que compõem sua jornada. 


(Greg Kelley and Jason Lescalleet)





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"WADADA LEO SMITH"
(Scott Grolle)

Único veterano desta lista, Wadada Leo Smith não poderia ficar de fora, dado o brilho e a inventividade de seu trabalho nos últimos tempos. Em meio a vários projetos e discos de excelência editados por ele neste século, se destaca ao menos uma obra-prima, “Ten Freedom Summers”, apresentada na íntegra em SP em 2012 – e que o levou a ser finalista do cultuado prêmio “Pulitzer”. Wadada, que esteve no Brasil em 2012 e 2014, teve uma última década fantasticamente criativa. Vida longa ao mestre.






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*quem assina:
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi também correspondente do jornal em Buenos Aires. Atualmente escreve sobre livros e jazz para o Valor Econômico. E colabora com a revista on-line portuguesa Jazz.pt. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), e “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records)