Play it Again... (novidades de Brasil, Portugal e Argentina)








Apanhado de novidades imperdíveis da free music.
Sons de todos os cantos, experiências em várias formas.
Ouça, divulgue, compre os discos.







Phylum
Romulo Alexis
Mansarda Records
****


Discos de trompete solo são menos comuns do que desejaríamos. Ao menos a nova geração (Peter Evans, Nate Wooley...) tem dado atenção a essa forma de expressão. Por aqui, chegou a vez de Romulo Alexis, trompetista radicado em São Paulo, deixar seu testemunho no formato. Pelo selo Mansarda Records, de Porto Alegre, Alexis edita este Phylum (ouça aqui), um conjunto de improvisações solísticas com instigante resultado. Revezando-se entre o trompete e pocket trumpet, o instrumentista testa uma variedade de boquilhas, surdinas, microfones e objetos outros para concretizar treze temas com uma ampla gama de investigação sonora, com resultados múltiplos que podem ir do breve recado em 57 segundos da faixa-título até o longo desenvolvimento dos quase nove minutos de “Perversidade Polimorfa”. Nas notas do disco é possível encontra breves explicações (ligeiros apontamentos) sobre os temas, que, em alguns casos, sinalizam para o rumo ou a intenção do instrumentista. Em “Sopro Proscrito”, por exemplo, lê-se: “Exploração de distorções na tessitura aguda do instrumento”. Investigando amplas possibilidades de se criar sons – ou melhor, de se fazer música –, Alexis mostra que muito ainda pode ser dito com esses instrumentos que tanto já deram aos nossos sentidos.  







Gravitat
Gravitat
7MNS Music
***1/2

 
Do “Circuito de Improvisação Livre” paulistano, por onde também circula Romulo Alexis, vem o quarteto Gravitat, que apresenta seu álbum de estreia. Circulando pelas vias da instant composition, o quarteto desenvolve quatro temas que navegam por uma gama de sonoridades e timbres graves – sax barítono (Rob Ranches), trombone (Daniel Carrera), baixo elétrico (Rodrigo Gobbet) clarinete baixo e bateria (Rubens Akira) compõem a palheta apresentada. As densas camadas criadas pelo quarteto têm na exploração do diálogo conjunto sua força, com alguns momentos de maior destaque a um ou outro instrumento – como o trombone nos primeiros minutos de “Piracanjuba”. Herdeiro da melhor tradição do free impro europeu, o Gravitat exibe quatro faixas que se desenvolvem sem pressa de encontrar uma conclusão possível, indo dos oito aos dezoito minutos cada, esgotando as vias escolhidas pelos instrumentistas para se expressarem.






Clocks and Clouds
Clocks and Clouds
FMR
****1/2

Formado por conhecidos nomes da cena portuguesa, o quarteto Clocks and Clouds lança seu disco de estreia após testar e exibir seu som pela noite lisboeta. A coesão sonora alcançada faz até que pensemos se tratar de um grupo fixo, ou melhor, central na vida dos instrumentistas. Mas esse trata-se apenas de mais um projeto dentre os vários em que estão envolvidos. O baixo e o piano, por exemplo, são protagonizados por Hernani Faustino e Rodrigo Pinheiro, do renomado “Red Trio”. Junto a eles nessa empreitada estão Luís Vicente (trompete) e Marco Franco (bateria). Trazendo elementos do free jazz e da free impro, Clocks and Clouds apresenta um som contemporâneo de grande vigor imagético, em que o jogo improvisativo do conjunto é o que mais importa: mesmo quando o trompete parece estar em primeiro (como em “Strangely Addictive”) é impossível os ouvidos não serem captados pelo dedilhado de Pinheiro ou ignorar o vigor do baixo de Faustino. É dessa forma, com o coletivo norteando o percurso, que o Clocks and Clouds desenvolve as sete brilhantes faixas do álbum. Obrigatório para entender o porquê de a cena de Portugal ser uma das mais interessantes da atualidade.







Xisto
Pedra Contida
JACC Records
***1/2

Diferentes abordagens das possibilidades oferecidas por um quinteto é o que apresenta o português Pedra Contida neste intrigante álbum. Comandado pelo guitarrista Marcelo dos Reis, o quinteto traz harpa (Angelica V. Salvi), sax alto (Nuno Torres), percussão (João Pais Filipe) e computador/eletrônicos (Miguel Carvalhais). Entre peças com formações distintas, “Xisto” é dividido em três partes. Na primeira, o grupo explora quatro composições de Reis. Na segunda, os músicos se dividem e temos, por exemplo, um duo de harpa e percussão e um outro de guitarra e sax. Na seção, uma longa improvisação com o quinteto reunido. O álbum é resultado de uma residência que o conjunto fez em Cerdeira, uma aldeia isolada na serra da Lousã. Esse distanciamento da cidade grande é perceptível no resultado do trabalho, marcado por momentos de divagação contemplativa que ecoam experiências da música contemporânea, entre passagens de algum vigor mais acentuado pela improvisação. Música para se ouvir sem distrações e, se possível, em um ambiente livre de ruidosidades.







Zero Sum
Fail Better!
JACC Records
****

Outro quinteto que tem à frente o guitarrista Marcelo dos Reis, o “Fail Better!” está em um polo bastante diferente do “Pedra Contida”. Aqui o free impro é o foco, e a energia do grupo, formado em 2013, é mais direcionada, menos fluida que a vista no outro projeto. O percussionista João Pais Filipe também está presente e a eles se juntam Luís Vicente (trompete), João Guimarães (sax alto) e José Miguel Pereira (baixo). Elementos jazzísticos e mesmo rocker (especialmente vindo da guitarra, que também desempenha importante papel na criação da atmosfera por meio da qual os outros instrumentistas se embrenham) se integram à improvisação coletiva que conduz o quinteto. Os diálogos entre sax e trompete são uns dos pontos fortes do álbum, ajudando a elevar por vezes o tom menos carregado da música apresentada.





  

Stoddard Place
Damián Allegretti
Independente
***1/2
 
O baterista argentino Damián Allegretti se uniu a Erik Friedlander (violoncelo) e Tony Malaby (sax tenor) em Nova York para fazer esse introspectivo registro, seu primeiro como líder. Com uma formação pouco usual – curiosamente, a mesma do português Motion Trio –, “Stoddard Place” apresenta nove temas escritos por Allegretti, para os quais a experiência improvisativa de Tony e Erik muito acrescentaram. “VI”, que abre o disco, tem como marca um inquietante tema conduzido pelo violoncelo, daqueles destinados a ecoar depois nos ouvidos por muito tempo. O disco, de um modo geral, soa relaxado, sem altos picos de tensão. Allegretti contou em entrevista ao ‘Argent Jazz’ que suas referências para compor o trabalho foram muito além do free e do jazz. “Empecé a escribir los primeros experimentos muy motivado por Earl Brown y John Cage, porque además de todo el background jazzístico me empecé a interesar mucho por la música contemporánea y por la forma de escritura alternativa.” Ouvindo o disco, ficam claras essas colocações.