ENTREVISTA O baixista Ingebrigt Haker Flaten é um dos nomes fortes que vem da Escandinávia. Ele acaba de chegar ao Brasil para quatro shows com o quinteto Atomic. “O público pode esperar por um show repleto de composições explosivas e improvisações dinâmicas”, disse Flaten, em entrevista ao FreeForm, FreeJazz.
Por Fabricio Vieira
Nascido em Oppdal, Noruega, em 1971, o baixista, que faz parte de um dos mais importantes grupos da atualidade, o The Thing, estudou jazz no Music Consevatory de Trondheim, entre 92 e 95. O músico acaba de se aventurar em um novo projeto, “The Young Mothers”, que conta com o rapper e trompetista Jawwaad Taylor, em uma mistura pouco usual e inovadora. “Considero esse o meu grupo mais importante no momento (...). Estou esperando que o álbum que acabamos de lançar crie alguma agitação e interesse no grupo para o futuro.”
FF - Você tocou no Brasil no ano passado em duas
oportunidades, com o The Thing e o Sun Rooms. Como foi essa experiência? O que o
público pode esperar dos concertos do Atomic?
Ingebrigt Haker Flaten: "Eu adorei tocar em São Paulo!! Encontramos um público tão
aberto quanto interessado na nossa música. Estou realmente ansioso para voltar!
O público pode esperar por um show repleto de composições explosivas e
improvisações dinâmicas. Nossa música engloba desde um swing jazzístico mais
tradicional até certo caos do free jazz e improvisações inspiradas na música
clássica contemporânea. O Atomic é um grupo muito dinâmico e posso garantir que
o público vai ter uma experiência musical excitante e variada! "
FF - Um parceiro muito antigo seu é o Paal Nilssen-Love, com
quem participa em diversos projetos (The Thing, School Days, Atomic...). Como
começou essa parceria? Veio de vocês a ideia de criar o Atomic?
Flaten: "Eu e Paal (e Håvard Wiik) nos encontramos pela primeira vez em
um curso de verão de jazz em 1992 e começamos a tocar juntos pouco depois, no
grupo “Element”, que era liderado pelo saxofonista Gisle Johansen e tocava uma
música muito inspirada no John Coltrane Quartet dos anos 60, do qual eu não
sabia nada naquela época... aquilo era uma aventura para mim! “Element” deixou
de existir em 1999 e nós (eu, Paal e Håvard) começamos o “Atomic” naquela
época, como um novo grupo que pudesse manternos tocando juntos. A primeira
versão da banda contava com o Håkon Kornstad (saxofonista norueguês). Depois,
em 2001, fomos gravar nosso primeiro álbum, “Feet Music”, para o selo Jazzland, e
Håkon não poderia participar daquela sessão. Foi aí que chamamos Fredrik
Ljungkvist e Magnus Broo para se juntarem à banda, e assim nasceu o Atomic como
o conhecemos hoje. O “The Thing” também começou a ser formado naquele tempo, em
1999."
FF - Você cresceu em uma época em que o rock já dominava a
cena. Como chegou ao universo do free e do jazz?
Flaten: "Sim, eu não sabia nada sobre jazz até meus 18 anos, não
havia nada disso onde eu cresci, apenas a música da igreja (minha família era
muito cristã e me levava para a igreja todos os domingos, até que eu percebi
que eu poderia dizer ‘não’... meu pai tocava órgão na igreja e toda a minha
família cantava e tocava uma porção de instrumentos). Meu primeiro verdadeiro
pontapé musical veio quando eu ouvi AC/DC, “Back in Black”, quando eu tinha 17
anos e, um pouco mais tarde, quando meu primeiro professor de baixo me
apresentou Jaco Pastorius (solo e, especialmente, com o Weather Report). Aquilo
me deixou curioso para descobrir o que estava acontecendo além da música
tradicional com a qual eu cresci. Eu comecei ouvindo Jan Garbarek e Keith
Jarret... Então meu professor de baixo me fez começar a tocar um contrabaixo
acústico e me apresentou o álbum “Looking the Bird”, com Niels Henning Orsted-Pedesen
e Archie Sheep, e aquilo acabou por me levar
a querer começar a estudar jazz, o que fiz no Music Consevatory de Trondheim, quando
eu estava com uns 21 anos. A partir daí, a bola de neve começou a rolar..."
FF - Podemos vê-lo tocando tanto o baixo acústico quanto o elétrico. Qual veio antes? Como se deu sua descoberta do instrumento?
Flaten: "Eu comecei tocando baixo elétrico em um coro gospel em
Oppdal (Noruega), quando tinha uns 12, 13 anos. Mudei para o baixo acústico
quando comecei a ter de fato aulas, aos 19. Minhas primeiras influências no
baixo elétrico foram Jaco Pastorius, Mark King e Abe Laboriel, e no baixo acústico,
Niels Henning Orsted-Pedersen, Scott LaFaro, Charlie Haden e Gary Peacock."
FF - Você está envolvido em uma série de projetos diferentes (The Thing, Atomic, The Young Mothers, Free Fall, IHF Chicago Sextet etc.). Esses projetos representam faces distintas de sua personalidade musical? Você muda sua forma de tocar de um para outro?
Flaten: "Não sinto que minha pegada, minha forma de abordar o
instrumento, mude de um grupo para o outro. Esses são grupos muito diferentes
entre si, que dialogam de formas distintas com o meu som, e ambos se alimentam
um do outro!"
FF- Tenho a impressão de que a cena musical na Noruega é bastante viva… O que o levou a se mudar para Austin, nos Estados Unidos?
Flaten: "Sim, a Noruega tem uma cena musical bastante fértil, sem
dúvida! São muitos artistas talentosos e criativos, fazendo música realmente
interessante, e na Noruega temos um importante suporte financeiro do governo, o
que torna possível que os músicos realmente explorem e se desenvolvam, o que cria uma situação bem favorável. Me mudei para Austin por causa da minha família (minha
esposa é de Houston), eu também adoro a cena em Austin e isso me dá inspiração
para viver e experimentar situações diferentes! Os músicos nos Estados Unidos
têm que realmente lutar duro para conseguir fazer o que estão fazendo e eu
gosto dessa “urgência” na criação da música e da arte. Algo que talvez falte na
Noruega. Mas eu gostaria que pudesse existir um ponto de equilíbrio entre os
dois polos."
FF- Na sua discografia recente, “The Cherry Thing” se
destaca como um projeto realmente especial, que chamou a atenção de um público
mais amplo para o trabalho de vocês. O grupo ainda está ativo? Podemos esperar
por um novo álbum, turnês...
Flaten: "Espero que sim!! Adoro esse projeto! Mas nesse momento a Neneh
Cherry está em turnê promovendo seu último álbum, não há planos imediatos para uma
nova colaboração entre nós, mas vamos ver..."
FF- No que você está trabalhando no momento? Novos discos, projetos...
Flaten: "Há muita coisa rolando! Estou trabalhando em novas
músicas para o IHF Chicago Sextet, que fará uma turnê na Europa em novembro, tenho
um novo projeto onde eu fiz novos arranjos para hinos da minha cidade, Oppdal,
junto com dois músicos populares (também de Oppdal), que espero que dê para gravar
durante 2014. Há diferentes álbuns/gravações ao vivo de novos grupos com quem
tenho tocado recentemente, com músicos norte-americanos, que esperamos que
saia em breve em um novo selo que estou desenvolvendo em Austin, e há muitas
turnês agendadas para EUA, Europa, Argentina e Japão, com o Atomic e o The Thing, para
os próximos anos. Eu também estou trabalhando duro para conseguir turnês e
concertos para o The Young Mothers, que eu considero o meu grupo mais
importante no momento, mas é realmente difícil conseguir dinheiro para poder
fazer uma turnê com um grupo americano, por isso estou esperando que o álbum
que acabamos de lançar crie alguma agitação e interesse no grupo para o futuro."
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*Para ver Ingebrigt Haker Flaten em ação:
“ATOMIC em SP”
Quando: Hoje (qua), às 21h
Onde: Sesc Santos
Quanto: R$ 4 a R$ 20
Quando: 17/4 (qui), às 20h
Onde: Sesc Piracicaba
Quando: 17/4 (qui), às 20h
Onde: Sesc Piracicaba
Quanto: R$ 2 a R$ 10
Quando: 19/4 (sab), às 20h
Onde: Sesc Sorocaba
Quanto: R$ 1,60 a R$ 8
Onde: Sesc Sorocaba
Quanto: R$ 1,60 a R$ 8
Quando: 20/4 (dom), às 19h
Onde: Sesc Pompeia (SP)
Quanto: R$ 4 a R$ 20*Photos: Peter Gannushkin (http://downtownmusic.net/)
++ Infos:
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*quem assina:
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Atualmente escreve sobre livros e jazz para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), e “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records)
Fabricio Vieira é jornalista e fez mestrado em Literatura e Crítica Literária. Escreveu sobre jazz para a Folha de S.Paulo por alguns anos; foi ainda correspondente do jornal em Buenos Aires. Atualmente escreve sobre livros e jazz para o Valor Econômico. É autor de liner notes para os álbuns “Sustain and Run”, de Roscoe Mitchell (Selo Sesc), e “The Hour of the Star”, de Ivo Perelman (Leo Records)