Por Fabricio Vieira
Ada Rave, Ingrid Laubrock, Virginia Genta. Vai crescendo o número de mulheres saxofonistas no universo do (free) jazz ou da improvisação livre. E Matana Roberts, que estará neste sábado em São Paulo para concerto único, é sem dúvida uma das vozes mais expressivas – entre os músicos todos que têm feito nossa contemporaneidade sonora...
Ada Rave, Ingrid Laubrock, Virginia Genta. Vai crescendo o número de mulheres saxofonistas no universo do (free) jazz ou da improvisação livre. E Matana Roberts, que estará neste sábado em São Paulo para concerto único, é sem dúvida uma das vozes mais expressivas – entre os músicos todos que têm feito nossa contemporaneidade sonora...
Desde que estreou em disco no começo dos anos 2000, Matana
tem mostrado como aliar lirismo e liberdade na feitura de uma música que
consegue alternar momentos mais relaxados com pontiagudas passagens solísticas.
Seu som não é ríspido como o de Virginia Genta, especialmente se ouvirmos seus
primeiros trabalhos, com o trio “Sticks and Stones”, ao lado de Josh Abrams
(baixo) e Chad Taylor (bateria). Apesar de ter realizado seus principais
projetos apoiada no sax alto, Matana também toca clarinete, instrumento que
primeiro estudou. Em conversa com o Free Form, Free Jazz antes de embarcar
para o Brasil, Matana falou um pouco de seu trabalho, suas ideias e projetos:
“Eu comecei no clarinete ainda criança, para depois chegar
ao saxofone, que foi [o instrumento] com o qual mais me senti confortável”, contou.
O concerto que fará na cidade deve ser de pendor mais intimista,
basicamente uma apresentação de sax solo – para a primeira parte da performance
está programada a participação do percussionista Maurício Takara. Matana esteve no Brasil em 2009, junto com a ‘Exploding Star
Orchestra’, do cornetista Rob Mazurek, em uma noite que contou com outras grandes
figuras, como Nicole Mitchell, Kevin Drumm e Roscoe Mitchell.
“Rob é um dos meus heróis. Eu tive grandes momentos com a
Exploding Star Orchestra, foi uma bela experiência. Conheci gente muito bacana
no Brasil e estou ansiosa para retornar ao país. O que não deu foi para
conhecer muito a música brasileira, mas espero mudar isso um pouco nesta nova visita!”
Diferentemente do que possa parecer a princípio, Matana não
pertence puramente à free improvisation. A composição é uma peça relevante de seu
processo artístico, como ficou explícito em seu ambicioso projeto “Coin Coin”,
do qual já tivemos a oportunidade de ouvir a primeira e segunda partes de um
painel que promete alcançar doze capítulos. Quem escutou “Coin Coin.
Chapter One: Gens de Couleur Libres” teve a oportunidade de se deparar com as
amplas referências que compõem essa personalidade múltipla. Jazz, blues,
improvisação e até spoken word marcam esse processo criativo, no qual há espaço
tanto para a improvisação quanto para a composição.
“Eu gosto de ser uma compositora e também de criar sons
conceitualmente. Acredito na liberdade sonora, mas realmente gosto de tocar
música que tenha ambas as ideias [composição e improvisação] funcionando juntas
o tempo todo.
“O projeto [Coin Coin] começou em 2005, graças a uma bolsa
concedida pelo
Roulette Intermedium de Nova York. Eu tenho um grande
interesse pela história americana e queria encontrar uma maneira de trazê-la ao
meu trabalho. Não tenho certeza de quando haverá um novo lançamento [do projeto
Coin Coin] ou quando o próximo capítulo estará pronto, estou atualmente
trabalhando nisso”, disse ao FreeForm, FreeJazz.
A música de Matana tem sido construída nessa década em diferentes formatos, trio, quarteto, a grande banda envolvida em Coin Coin ou mesmo as experimentações solísticas que veremos no sábado. Contemporânea e (pós)moderna, a música da Matana não chega a se embrenhar pela improvisação livre, mas também não se mantém dentre de uma linhagem jazzística (ao menos ela diz que não):
“Definitivamente não faço jazz. Também não faço ‘free
music’, talvez avant-garde... Não me considero uma jazzista. Trata-se apenas de
sons que intimamente falam de mim. É uma mistura experimental de ideias que me
inspiram, é algo que não pode realmente ser rotulado”, explicou Matana.
Cria da rica cena musical de Chicago, a saxofonista fez
parte da lendária cooperativa AACM (Association for the Advancement of Creative
Musicians), casa de Wadada Leo Smith e do Art Ensemble of Chicago. Qual o papel
da AACM hoje para a formação e divulgação da great black music?
“Eu sou uma ex-membro da AACM. Estive em atividade por um
relativamente curto período de tempo, enquanto vivia em Chicago, depois me
tornei membro associado quando me mudei para Nova York. Sou muito grata a
eles por sua positividade e apoio ao longo dos anos, sinto que são um grupo
muito especial e que merece sempre estar em foco. Mas não posso falar sobre
como trabalham hoje, não sei ao certo o que acontece [na AACM] agora, meu
envolvimento com eles desde que parti para Nova York tem sido superficial.”
Matana tem estado em destaque desde a época do Sticks and
Stones, mas, indiscutivelmente, foi a partir de 2011, com o lançamento de “Coin
Coin” (que figurou em vários ‘Top 10’ do ano passado), que a saxofonista passou
a receber uma atenção mais ampla. Será que essa exposição maior tem ajudado a chamar
a atenção para as mulheres saxofonistas ou das mulheres para o sax como caminho
de expressão artística?
“Não tenho certeza se o meu trabalho ajuda a incentivar as
mulheres a tocarem sax. Eu só espero que isso tudo inspire as pessoas a fazerem
arte, pouco importando o meio escolhido. Há uma porção de mulheres saxofonistas
por aí, apenas não recebem ainda atenção da imprensa.
“Acho que é importante para os músicos mais experimentais
continuarem tocando e buscando oportunidades para mostrar [o que fazem]. Se
você faz um trabalho honesto, acredito que as pessoas acabarão por
descobri-lo”, conclui a saxofonista.
“MATANA ROBERTS”
Quando: hoje (sab); às 21h
Onde: Sesc Belezinho
Quanto: R$ 6 a R$ 24