Joe McPhee, 71, ainda com muito fôlego

O tenor é a base, mas há espaços relevantes para outros instrumentos –trompete, alto, soprano– na palheta de Joe McPhee. O saxofonista americano, nascido em Miami em 1939, deu início à sua história musical ainda na década de 1960; a primeira aparição em disco ocorreu em 67, tocando trompete no álbum “Freedom and Unity”, de Clifford Thornton. Apesar de o sax ser seu veículo central, McPhee começou com o trompete, no qual foi iniciado aos oito anos de idade, permanecendo fiel ao instrumento até a fase adulta. Ele assumiria o sax tenor apenas quando já contava com uns 27, 28 anos.

É como tenorista que McPhee faz sua carreira deslanchar na década de 70. “Nation Time”, captado em dezembro de 1970, se tornou seu primeiro clássico. Nesse álbum, o saxofonista incorporou elementos de funk e soul à sua peculiar visada free. Logo depois viria “Black Magic Man”, seu trabalho mais cruamente free jazzístico do período, que seria lançado em 75 pelo então novo selo suíço Hat Hut, responsável pela edição de seus álbuns até a década seguinte. Dessa época, datam os fundamentais “The Willisau Concert” e “Tenor”, seu primeiro disco solo. A discografia de McPhee nos anos 70 mostra que o músico não estava interessado apenas em fazer energy music. Investigações de diferentes naturezas, como o diálogo com sonoridades eletrificadas (sintetizadores, piano e baixo elétricos: mas nada a ver com o fusion da época), marcam sua obra. Nesse tempo, McPhee pouco trabalhou com músicos dentre os mais destacados da cena free. O pianista Mike Kull e o baterista Harold E. Smith foram os parceiros mais constantes no começo. Depois, com suas longas passagens pela Europa, se ligou a nomes como os franceses Raymond Boni e André Jaume.

A entrada nos anos de 1980 trouxe outras vias de exploração. A associação com a compositora Pauline Oliveros e com seu Deep Listening é um dos destaques, ao lado da descoberta do trabalho do Dr. Edward de Bono, autor de livros como “Word Power”. A filosofia do Dr. Bono tinha em sua matriz a sílaba “PO”, ligada a palavras como positive, possible, poetic. “PO” seria uma nova forma de compreender e encarar o mundo, além da simples dualidade do ‘sim/não’ que rege o cotidiano. Inspirado por tais conceitos, McPhee começou a fazer o que chamava de “PO Music”; do período, ficaram os registros “Topology” (81) e “Oleo” (82). Após um resto de década menos intenso, uma nova etapa destacada nasceria com os anos de 1990, quando a geração mais jovem redescobriu e aliciou o saxofonista para seus frescos projetos. Ken Vandermark, Mats Gustafsson, Kent Kesller, Hamid Drake, Jay Rosen e Dominic Duval (com os quais mantêm o "Trio X") são alguns dos que passaram a trabalhar frequentemente com McPhee. Peter Brotzmann, Evan Parker e Matthew Shipp são outros que realizaram trabalhos com ele. Já sob a aura de lenda, McPhee tem vivido em intensa atividade musical, com excursões e gravações contínuas. Um de seus últimos discos é Blue Chicago, um belíssimo duo de sax-baixo realizado ao lado de Ingebrigt Haker-Flaten, com quem havia trabalhado antes no grupo “The Thing”.

------------------------------------------------------
Na década de 1970, Joe McPhee concebeu alguns álbuns tendo John Snyder nos sintetizadores, como “Pieces of Light”, de 74, e Rotation, de 76.
Rotation é um dos interessantes rebentos de McPhee do período. Alternando-se em momentos solistas, duo e trio, o músico explora o tenor, o soprano e o trompete. Depois de se exibir de forma solista (inicia com tenor e troca pelo soprano), McPhee recebe a companhia de Snyder. O sintetizador de Snyder cria uma atmosfera estranha e uma espacialidade que envolve o sopro de Joe, em meio a uma aura free improv distante de qualquer esfera jazzística. Entre rugidos, trinados e sutilezas melódicas, McPhee elabora as trilhas que se convertem às vezes em rudes ambiências, selando a singularidade desse Rotation, peça esquecida em sua discografia.





*Joe McPhee: tenor, soprano, trumpet
*John Snyder: synthesizer
*Marc Levin: trumpet, flugelhorn, mellophone (c- Episode 2)


Recorded September 3d, 1976, at the Jazz In Basel concerts.