Um músico, um instrumento (Solo II)

Charles Gayle talvez pudesse ser considerado o mais experiente dos músicos vivos no campo solista. Digo isso pela sua história, pelo longuíssimo período, entre os anos 70/80, que passou tocando sozinho nas ruas e metrôs de NY em meio à sua condição de sem teto, antes de ser ‘resgatado’ no fim da década de 1980.
Se considerarmos sua discografia, os exemplos de trabalhos solistas não são dominantes, mas se dispersam por interessantes documentos: há “Unto I Am” (1994), no qual se divide entre sax, bateria e piano; “Jazz Solo Piano” (2001) e “Time Zones” (2006), dedicados à sua faceta de pianista; e “Solo in Japan”, centrado no sax.

Gayle tem se concentrado em pequenas formações, especialmente trios e quartetos. Uma vez, indagado por um jornalista sobre se a preferência por pequenos grupos estava ligada à sua percepção artística, respondeu realista e acidamente: “Pelo que recebo por gravações e shows, se eu resolver convocar mais gente não sobra nada.”

Ouvir Gayle lidando com o saxofone é uma experiência sempre tocante. O músico, em meio a construções mais intensas, que exalam dissonâncias várias, lida paralelamente com um campo melódico, melancólico, solitário –ecos dos tempos mais duros, em que tocar sozinho era a única saída e não uma opção?


*Charles Gayle: sax tenor; piano (5)
Recorded July 6 & 7, 1997.