Rodrigo Amado: em meio a sons e imagens


Quando falamos em jazz/free jazz/free improv realizados na Europa logo vêm à mente nomes de músicos alemães, franceses, ingleses e italianos, mas, dificilmente, nos lembramos dos portugueses. Como ocorre com a produção jazzística argentina, raramente nos deparamos com um lançamento ou uma apresentação de seus músicos no Brasil. Todavia, mesmo na seara mais abstrata da free improv, Portugal tem nomes de respeito, como o veterano violinista Carlos Zíngaro e o jovem guitarrista Manuel Mota (que abriu para o Sonic Youth no Porto, em show solo). Mas a ideia aqui não é a de dissertar sobre o território jazzístico português e sim destacar o trabalho de um saxofonista que tem conquistado crescente espaço na cena internacional: Rodrigo Amado.

Nascido em Lisboa em 1964, Rodrigo Amado iniciou seus estudos de saxofone apenas aos 17 anos. Tendo estudado com Carlos Martins e passado (brevemente, afirma) pela tradicional 'Escola de Jazz do Hot Club de Portugal', Amado iniciou-se no alto, indo depois para o barítono e chegando, mais recentemente, ao tenor (que tem se destacado em seus últimos discos). Depois de passar por bandas mais ligadas ao rock e/ou a rumos experimentais distantes do mundo jazzístico, Amado foi direcionando seu foco, especialmente a partir de meados dos 90, ao campo da free improvisation. Em sua jornada, já se encontrou em palco ou estúdio com nomes como Gerald Cleaver, Dominic Duval –dois grandes músicos que já pudemos apreciar em nossos palcos–, Dennis Gonzalez, Kent Kessler, Paal Nilssen-Love, Carlos Zíngaro, Vinny Golia, Raymond Strid e Mike Bisio. Mais recentemente, Amado estabeleceu um grupo fixo, o “Motian trio”, formado com os também portugueses Miguel Mira (celo) e Gabriel Ferrandini (bateria). Com essa formação lançou, em 2009, o elogiado disco “Motian Trio”.

Com sopro mais próximo (e não me refiro a uma questão geracional, mas sim estética) de um Ken Vandermark do que de Brotzmann, Braxton ou Evan Parker, o saxofonista português tem desenvolvido uma obra que já conta com uma sólida sintaxe. São nove os álbuns que trazem Amado como líder ou co-líder. O último, Searching for Adam, é um quarteto (sax, trompete, baixo, bateria) que tem nas baquetas Gerald Cleaver, que esteve com o Ivo Perelman Quartet pelo Sesc em setembro. Amado desfia seu fraseado alternando picos de ataque com articulações de sílabas alongadas e ruminantes, tudo isso gestado a partir de aberturas movidas por rastros melódicos, contemplativos às vezes. Dono de voz singular e penetrante, Amado tem saboreado a ampliação do reconhecimento à sua criação musical (está na hora de alguém convidá-lo a vir e engrandecer nossos palcos!).

Além de desenvolver seu trabalho como saxofonista, Rodrigo tem atacado em outras frentes. Em 2001, se uniu aos irmãos Pedro e Carlos Costa em torno do selo Clean Feed –importante referência dentre os distribuidores de música free na Europa de hoje.  Em 2005, fundaria seu próprio selo, “European Echoes”, pelo qual tem distribuído seus discos mais recentes. Outra faceta do saxofonista é a de fotógrafo. Fotos suas podem ser conferidas em capas/encartes de seus álbuns. Amado tem exposto em diferentes galerias e algumas de suas séries fotográficas estão disponíveis em seu site. Para completar sua multifacetada criação, ele passou a exibir sua face de crítico de jazz, no periódico “Público”.


Já é tempo de os ouvintes brasileiros interessados em jazz/free jazz/free improv expandirem seus horizontes auditivos para além dos trajetos usuais e captarem o que têm sido feito por nossos ‘hermanos’ argentinos e portugueses. Muita coisa a ser descoberta. Esse deveria ser um intercâmbio simples, fluido e intenso; porém, por essas infelicidades que tumultuam os processos culturais e artísticos, não tem ocorrido... hora de mudanças?


Para conhecer mais:

http://www.myspace.com/rodrigoamado

ps: as fotos são de autoria de Rodrigo Amado