Imagens de Ornette, Cage e Kirk

Talvez a intenção da distribuidora não fosse a de lançar um vídeo com o Ornette Coleman, mas sim enfocar o trabalho do diretor britânico Dick Fontaine. De qualquer forma, acabamos por ter a sorte de lançarem por aqui esse “Ornette Coleman Trio + Sound??”. Digo isso pelo perfil da Magnus Opus, que se concentra em cinema experimental e ‘cults’ esquecidos, como o genial box “Cinema Avant-Garde”, em quatro volumes (no catálogo deles aparece muita coisa interessante; destaque para JL Godard ('Sympathy For The Devil') e filmes de Andy Warhol). Gravados em 66/67, os dois curtas (pouco menos de 30 minutos cada) se complementam, mostrando perspectivas variadas sobre como pensar e fazer música. 
A história do “Ornette Coleman Trio” (originalmente: “David, Mofett e Ornette”) é simples: Ornette estava em Paris para participar da criação da trilha sonora do filme “Who’s Crazy”. E Dick Fontaine aproveitou para fazer um pequeno documentário sobre o trabalho, com declarações dos músicos alternando-se com cenas deles em ação. Ornette estava acompanhado do baixista David Izenzon e do baterista Charles Moffet. Além do sax, aparece tocando trompete, violino e dedilhando um piano. Em certo momento, falando de sua música, Ornette diz: “As pessoas te colocam em uma categoria, porque dizem: ‘Bem, ouça, isto é mais estranho do que eu posso imaginar, então vou colocar aí e fico mais seguro assim’. E pode não ser nada disso!” Coleman se referia a rotulações e comparações musicais. E tem toda razão: apesar de usarmos sempre ‘rótulos’, categorias e estilos para falar de músicos e músicas, isso é, na realidade, estéril e inútil. Particularmente, ainda utilizo tais ‘rótulos’ como forma de tentar ajudar as pessoas a se localizarem. Mas, no fundo, muitas vezes isso mais atrapalha do que ajuda... Apesar do prazer de ver Ornette em ação, o curta “Sound??” é uma peça artística mais genial. Fontaine reuniu nesse filme John Cage (1912-1992) e Rahsaan Roland Kirk (1936-1977). Mas os músicos nunca estão em cena juntos. O que Fontaine fez foi colocar Cage para expor suas idéias sobre as relações entre sons e silêncio, enquanto imagens de Roland Kirk tocando em vários contextos surgem na tela. E o resultado é realmente complexo e instigante.