Mats Gustafsson: além do jazz

O diálogo de Mats Gustafsson com sonoridades além-jazz é uma das marcas de sua obra. Tendo o tenor e o barítono como seus principais veículos, Mats costuma se aventurar por outros sopros: alto, flauta, soprano, sax-contrabaixo. Nascido em 1964 em Umea, norte da Suécia, Gustafsson passou a ter seu trabalho mais difundido e conhecido a partir do final da década de 90. Parcerias com Peter Brotzmann, Joe McPhee, Barry Guy, Otomo Yoshihide, Hamid Drake, Ken Vandermark, Lee Ranaldo, Thurston Moore, Han Bennink, montam um currículo que conta com mais de 150 gravações.
Suas diversas parcerias também renderam diferentes projetos, que resultaram em turnês e discos: apenas para citar os de maior envergadura: The Thing, trio sax-baixo-bateria que explora versões e sonoridades do free clássico e do garage rock; Sonore, trio de sopros (com Brotzmann e Vandermark), bastante abstrato; AALY Trio; e GUSH.


Um de seus projetos mais experimentais _improvised music, distante do jazz_ é o Diskaholics Anonymous Trio, formado ao lado de Thurston Moore e Jim O’Rourke. O grupo apareceu no começo da década e lançou três discos até o momento. Longas improvisações, momentos de maior agressividade permeados por extensas passagens etéreas, trabalho sempre instrumental, o Diskaholics Anonymous Trio pode sofrer certa rejeição tanto dos aficionados do jazz quanto os do rock (ou, mais precisamente, pelo som do Sonic Youth). A guitarra de Thurston Moore está aqui a serviço de ruidosas espacializações e solos improvisados: nada das ríspidas (às vezes acolhedoras, sim) melodias do Sonic Youth. Levadas pop e vocais então... Jim O’Rourke também é conhecido dos frequentadores do Sonic, tendo colaborado em discos como "NYC Ghosts & Flowers" e "Murray Street".

No primeiro álbum do Diskaholics Anonymous Trio, os músicos espalham suas improvisações por três extensas faixas. Quem ouvir esse som pela primeira vez talvez se sinta desconfortável para acompanhar o transcorrer das faixas. A questão aqui não é falar em dificuldade, mas em estranhamento diante de uma música sem marcação rítmica precisa ou melodia palpável. Mesmo o pulso enérgico característico do free jazz, que poderia ajudar a conduzir o ouvinte pelo álbum, não é uma marca que podemos apontar aqui. Mais do que sons individuais, os músicos produzem blocos sonoros que vão se transformando, ora mais densos, ora com destaque para um ou outro colorido instrumental. As texturas eletrônicas granuladas de O’Rourke não servem apenas de base, alternam-se em passagens de destaque com os sopros de timbres variados de Mats e a guitarra de ruídos de Moore. Música abstrata, avant-garde, inquietante. Para que serve mesmo a arte?




1. Tree Collectors of Bird Note [16:36]
2. Totally Gump [23:07]
3. Yellow Label Silence [26:43]



Date: september/2000




Ps: já postei por aqui um vídeo de Thurston e Mats em ação, que merece ser revisitado por quem se dispuser a explorar esse álbum