Rashied Ali morreu. Um dos maiores bateristas da história da música, sempre lembrado por ter sido o último parceiro de John Coltrane. Mas dizer isso é muito pouco: seu período traneano foi curto, menos de dois anos apenas. E a música de Ali se estendeu por mais de quatro décadas. Compôs, liderou grupos, levou a bateria ao extremo do free.
Nascido Robert Patterson em 1935, na Philadelphia, Ali começou a tocar percussão na banda do exército, passando na juventude por grupos de rhythm & blues e rock. Ainda jovem se aproximaria da cena jazzística para, nos 60, deixar seu toque cada vez mais free ganhar corpo. Quando sentou atrás da bateria para dar suporte ritmico a John Coltrane, já era um músico formado, com um som próprio. Em novembro de 65, Coltrane colocou juntos dois bateristas (Ali e Elvin Jones) para criar uma de suas preciosidades: Meditations. Jones deixaria a banda e Ali assumiria as baquetas até o fim da vida de Trane.
Nos 70, Ali abriu o seu loft-jazz club, o Ali’s Alley, que, antes de fechar em 79, foi um dos pontos de fervura do som radical do período.
Listar os músicos que tiveram a honra de ter Ali como escudeiro percussivo exigiria muitas páginas: Alice Coltrane, Archie Shepp, Frank Lowe, Marion Brown,, David Murray, Ivo Perelman, William Parker, Arthur Rhames, Charles Gayle, Dewey Redman, Peter Brotzmann etc etc.
Na década de 90, formou ao lado dos saxofonistas Louis Belogenis e Allan Chase e do baixista William Parker a “Prima Materia”, banda com a qual produziu discos como “Peace on Earth”, dedicado à obra de Trane. Nos anos recentes, o baterista liderava o The Rashied Ali Quintet, que rendeu algumas de suas últimas gravações, como os dois volumes Judgment Day, captados em 2005.
“Duo Exchange”, duo com o saxofonista Frank Lowe, gravado em 1972, talvez possa ser considerado o primeiro álbum que teve Ali como líder. O disco traz os músicos em duas longas improvisações (que somam quase 29 minutos), nas quais o formato sax/bateria _imortalizado em “Interstellar Space”, gravado por Ali e Trane em 67_ mostra toda sua potencialidade, em muito devido à intensa cumplicidade entre os sons dos músicos. A bateria de Ali desliza polirritmica, multitonal e polifonicamente, enterrando qualquer preconceito que relegou à percussão o papel de servir apenas de “cozinha” a solos e devaneios dos outros músicos.
Elvin Jones (1927-2004), Max Roach (1924-2007), Rashied Ali (1935-2009): o mundo anda tristemente bem mais silencioso...